Retorno a 20 km, dizia a placa.
Ele apenas sorriu e foi em frente. Lembrou do tempos de sua infância, das brincadeiras com os amigos, das brigas com os adversários. Às vezes uns se confundiam com os outros.
Havia tanta coisa pela frente e tanto tempo para fazer tudo. Sentiu saudades das idéias e dos sonhos que tivera, uns poucos realizados, nem todos como gostaria.
Tivera momentos felizes, mas eram difíceis de se lembrar, muitas vezes. Era mais fácil lembrar dos momentos ruins, das dificuldades, dos erros. Se descobrisse quem tinha inventado a memória desse jeito torpe, iria dar-lhe um soco na cara.
E se for eu? Pensou sombriamente. Lembrou de um filme em que o personagem dava uma surra em si mesmo e não conteve a risada.
Poderia tentar, por quê não? Dizem que somos os nossos maiores inimigos, então seria justo fazer isso.
Retorno a 15 km.
Quando encontrara a sua primeira paixão a vida tinha ganho um colorido diferente, por algum tempo. Investira nesse caminho como um desesperado e superara dificuldades que antes o teriam parado facilmente. Que loucura, pensou, talvez tivesse dado certo se tivesse sido diferente, ou talvez tivesse sido apenas diferente. Fez uma anotação mental para socar também o inventor do livre arbítrio, melhor seria ter a sua vida sinalizada por placas.
Cuidado, curva acentuada a direita; Siga em frente; Lombada, reduza a velocidade; Cruzamento de Vias.
Na vida tudo é passageiro, exceto o motorista e o cobrador. Isso também estava errado. O motorista cobrava a si mesmo e como passageiro não dirigia nada, apenas seguia em frente sem um rumo certo, desviando aqui, esbarrando em coisas que surgiam, decaindo.
Retorno a 5 Km
Foi uma longa viagem, cheia de altos e baixos. Lembrava mais dos baixos porque tinha que ir mais devagar, tinha que tomar mais cuidado. Os altos serviam para aumentar a velocidade na descida e reduzir na subida. Os únicos engenheiros que gostava eram os do Hawaii, pelo menos eles tinham planos. Riu novamente da própria piada.
Até que não estava sendo tão ruim quanto imaginara que fosse, seria uma esperança de final? Seria uma aceitação de todas as coisas? Quem se importa com isso.
Lembrava de frases soltas, chavões filosóficos, sabedoria popular. Como se o povo fosse sábio; Nem escolher governantes sabiam. Sobreviviam a cada catástrofe criada porque não tinha jeito, e criavam novos problemas. Talvez fosse culpa do destino, as coisas tivessem que acontecer assim mesmo e não adiantava desviar do caminho.
Destino, mais um que gostaria de socar bem socado. A lista estava crescendo rapidamente. Conquistara mais inimigos do que poderia imaginar, mas estes pareciam acompanhá-lo por mais tempo do que os amigos; inimigos fieis. Outra grande piada.
Poderia ter se tornado humorista se tivesse descoberto essa veia artística antes, quando ainda havia tempo para...O quê mesmo? Se encontrasse Deus iria...Ah, deixa pra lá, já estava ficando repetitivo.
Retorno - Siga em Frente
Contradição, que coisa esquisita para se perceber a essa altura. Retornar é seguir em frente, da mesma forma. Deveriam mandar as pessoas retornarem de costas, voltar no tempo e no espaço, regredir a um estado de...O que mesmo?
Se voltasse de costas teria que passar por tudo de novo, não teria entendido nada, não teria feito nada, não teria vivido nada. Tudo ou Nada. Deu mais uma risada. Seguiria em frente. Essa, afinal, era a grande piada.
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