quinta-feira, 30 de junho de 2016

PIRÂMIDE DA TEORIA DA CONSPIRAÇÃO - Danny Marks



Anteriormente apresentei as bases gerais da construção de uma Teoria da Conspiração, bem como a forma de se criar camadas que manipulam as informações e induzem as perspectivas gerenciáveis. Foi apresentada uma TC baseada em fatos locais facilmente reconhecíveis, com alguns questionamentos válidos que poderiam ser trabalhados no seu desenvolvimento ficcional. Agora a proposta é ampliar o foco e aprofundar ainda mais a complexidade e descer aos níveis mais profundos possíveis. Para isso será necessário observar alguns outros elementos que vão aos poucos construindo o nosso panorama geral ao mesmo tempo que servirão de bases para a ampliação, reformulando o entendimento do que já havia sido apresentado e obrigando uma nova perspectiva e reinterpretação.
Observemos as crises em vários países e até mesmo em blocos econômicos. O Mercosul que até hoje não decolou, a crise na Síria que desestabilizou a União Europeia, o terrorismo internacional.  Como juntar tudo isso em uma TC que ampliaria em diversas camadas a nossa base local? Como fundir a crise brasileira em uma crise global, com interesses particulares extremamente complexos e verossímeis?
          Basta acrescentar um elemento comum a todos, algo tão grande e insuperável que obrigue a medidas extremas, complexas, de curto, médio e longo prazo. Não vamos falar em guerra global. Quando as armas nucleares entraram no cenário foi necessário rever essa forma de atuação, a “Guerra Fria” foi uma solução paliativa que acabou se tornando obsoleta e revista no seu devido tempo e embora tenha rendido boas histórias conspiratórias, precisou evoluir. É preciso pensar em algo que motivasse governos em diversas camadas conspiratórias, algo que fale diretamente na questão da sobrevivência pessoal e global em níveis incontestáveis quanto a necessidade de medidas extremas e que não provoque nada semelhante a um conflito armado global. Mas o que seria?
          Posso começar pelo óbvio e pensar na superpopulação do planeta. Na crise cada vez mais grave no gerenciamento de recurso finitos. Não importa o quão rápido a ciência gere recursos, em algum momento não teremos espaço para tantas vidas, não teremos como sustenta-las com alimentos, com expectativa de vida minimamente razoável. Quando populações inteiras são submetidas a condições de vida precárias há necessariamente a revolta, seja local, seja internacional. Alguns dirão que isso já foi revisto, que as técnicas de produção, armazenamento e distribuição evoluíram de forma a jogar para um futuro indeterminado essa necessidade de rever as políticas de natalidade globais. Será? Em se tratando de uma TC sempre é preciso cuidado, poderíamos pensar na manipulação de informações, programas de desestimulação de famílias grandes, revisão dos comportamentos sexuais para fins não reprodutivos. AIDS entraria facilmente nessa lista, apoio ao homossexualismo, incentivo a busca da realização pessoal individual. Tudo pode ser utilizado para questionar as intenções por trás de políticas globais e lançar dúvidas argumentativas perfeitamente coerentes, mesmo que totalmente erradas. Gerar a desconfiança é tão útil quanto promover certezas quando se trata de construir teorias conspiratórias, as realidades podem ser facilmente torcidas e distorcidas para atender os objetivos dos conspiradores.
          Então vamos buscar alguns elementos históricos. Lembre-se que uma boa TC precisa gerar sentimentos fortes para reduzir a intervenção racional. Tivemos a crise na Etiópia que gerou uma comoção mundial, foram feitos bons negócios para aplacar a fome na África e mitigar os espíritos mais privilegiados de condições. E ainda assim, há fome na África e em outros lugares do mundo. Os corações abertos foram se fechando aos poucos, assim como os bolsos, quando as epidemias começaram a se alastrar de forma global, muitas delas à partir da própria África. Ebola, AIDS, Gripe Aviária, Gripe Suína, Vaca Louca, só para citar as mais famosas, provocaram ações antes impensáveis. Em tempos de crise alimentícia no mundo todo, toneladas de alimentos foram sistematicamente destruídos, segmentos sociais excluídos e olhados com desconfiança, o medo se alastrando e exigindo soluções desesperadas antes inconcebíveis.
          Quem foi capaz de pensar em genocídios seletivos através de doenças sistematicamente desenvolvidas para mitigar os efeitos da superpopulação no planeta, ao mesmo tempo em que bons negócios proliferavam devido à crise de abastecimento de alimentos e até mesmo de remédios, pode pegar seu diploma de conspirador, e esconde-lo para não se revelar. Sim, essa é uma boa argumentação para mais uma camada conspiratória que se liga ao momentum local. Basta consultar os arquivos históricos e elaborar suas teorias utilizando como bases empresas multinacionais, pan-nacionais e governos corruptos, fatos noticiados alimentariam facilmente milhares de histórias conspiratórias com cenários locais e/ou internacionais.
          Mas é possível outras abordagens mais dramáticas, mais profundas e, porque não dizer, mais sórdidas. Afinal estamos adentrando os subterrâneos mais profundos das Teorias da Conspiração e o Inferno é o limite, certo? Para ir mais fundo é preciso ter uma percepção mais crua, mais dramática e desconstrutiva dos valores humanos. Precisamos mergulhar fundo nas piores possibilidades da crueldade humana, no egoísmo alienante que beira os limites da sociopatia. Eu digo limites porque nem todos conspiradores são sociopatas, é importante destacar que a ferramenta da TC não age apenas na vítima, mas no próprio executor. Com argumentos bem convincentes é possível que o próprio conspirador passe a acreditar na mentira que propaga, justificando até mesmo para si os seus atos condenáveis, o que não seria necessário no caso de um legítimo psicopata.
          Diferentemente da psicopatia, em que a ausência do reconhecimento dos sentimentos do outro e da possibilidade de empatia, impede um convívio social saudável, a sociopatia se desenvolve na alienação em relação a segmentos sociais. Um sociopata é capaz de conviver muito bem com os seus semelhantes, mas se exclui de todo o resto da raça humana por se considerar acima destes. Se considera como alguém que merece ter a sua sobrevivência assegurada por ser essencial ao projeto de humanidade que se molda aos seus interesses. Portanto acha totalmente justificável sacrificar inocentes para que se salvem alguns. Notavelmente essa linha de pensamento já demonstra a sociopatia implícita no discurso de que “se tiverem que morrer alguns inocentes para preservar a ordem, que seja”. Como o sociopata não se julga inocente, de certa forma se exclui dos que irão morrer por César.
          Então como seria possível incluir essa camada mais vil e fortemente emocional naquelas camadas anteriormente apresentadas de forma que atinja um nível ainda maior da TC? Simples, mas para isso precisa-se lançar mão de algumas teorias paralelas. Uma delas é a da pirâmide social.
          Pela lógica da pirâmide social, quanto mais próximo do cume menos indivíduos. Ou seja, quanto mais alto na pirâmide de poder e recursos, menos pessoas com maior capacidades e recursos de manipular toda a base que os precede. Portanto, temos camadas e camadas de gerentes de recursos cujo único objetivo é cada vez mais acumular recursos e poder para fazer parte daquela ínfima classe, invisível à base geral, que comanda todo o resto sem ser comandada por ninguém. No topo da pirâmide apenas alguns são admitidos, com os recursos que ultrapassam absurdamente blocos inteiros em que se apoiam e que comandam. Uma boa metáfora seria uma arvore minúscula, com apenas uns poucos frutos, alimentada por raízes homéricas espalhadas por extensões absurdamente grandes.
          Quantos teriam nessa “seleta” parcela da comunidade piramidal? Podemos escolher qualquer número simbólico. Treze, dez, sete, seis, não importa. O principal é que sejam invisíveis, ainda que observáveis. Seria necessário que fossem reconhecíveis entre os poderosos, mas jamais apontados como os “Donos do Mundo”. Do contrário, seriam alvos fáceis e não se sustentariam. Também seria necessário que se traçasse um caminho possível para alcançar essa posição, um caminho que necessariamente iria igualando o pretendente a todos aqueles a quem pretende ter acesso. A lógica aqui é de que apenas um sistema igual é capaz de combater um outro sistema; ou de que só se pode substituir uma peça do sistema por outra equivalente, o que torna impossível destruir o sistema. Aliás, a base de qualquer TC é de que é impossível destruir o sistema que ela denuncia, não importa o que seja feito, no máximo pode-se alterar os seus componentes. Será?
          Então, para finalizar, vamos aplicar o que foi apresentado até agora na nossa TC fictícia e dar por encerrado esse exercício imaginativo. Qual motivação seria necessária para que os “Donos do Mundo” decidissem provocar uma crise global, com diversas camadas de conflitos localizados, aproveitando os recursos gerados a partir das manipulações agressivas, mas com resultados temerários e de difícil controle? É preciso lembrar que uma guerra global com armas nucleares não é de interesse para ninguém, principalmente para os orquestradores da TC, então o que motivaria algo tão arriscado?
          Posso pensar em várias soluções para isso, mas vou apresentar apenas uma mais simples e que atende completamente ao mais cético leitor: Aquecimento Global.
          Como assim? Uma teoria da conspiração fundada em algo que está visível em qualquer noticiário das últimas décadas? Algo que já foi discutido e reconhecido à exaustão? Pois é, simples assim. Vamos testar a hipótese?
          — Princípio da Universalidade – Afeta a todas as pessoas no planeta.
          — Princípio da Realidade – Não há como negar os efeitos gerados pelo aquecimento global, está noticiado e comprovado de diversas formas.
          — Principio da Simplicidade – É compreensível a qualquer um, embora possa ser trabalhada em diversos níveis de complexidade nos interesses de governos, empresas ou segmentos organizados.
          — Principio da Solução – É possível “combater” os efeitos danosos com práticas ecológicas globais, ou aliar-se aos que promovem os seus efeitos planejando como adquirir mais recursos durante a própria crise.
          Atendidos os requisitos necessários, podemos então usar a argumentação para elaborar a TC. Qual o motivador das ações dramáticas? Posso listar alguns:
          — Sobreviver à catástrofe que está para ocorrer em nível global.
          — Reduzir o “rebanho” de forma drástica, fazendo com que os melhores adaptados possam sobreviver e reconstruir a sociedade sob novos moldes, atendendo, é claro, aos interesses dos Donos do Mundo.
          — Arregimentar recursos durante a crise, basta lembrar do conceito de criatividade expandida e investimentos massivos devido à crise generalizada.
          — Apagar completamente os indícios que demonstrariam claramente quem provocou o aquecimento global e se beneficiou dele.
          Como juntar todas as peças de forma a traçar uma linha entre a base e o topo da “pirâmide”? Partindo de uma conspiração local e esmiuçando os motivadores até se “descobrir” relatórios que comprovem “cientificamente” que os efeitos climáticos serão menos sentidos em uma região específica do planeta, por exemplo, as áreas equatoriais e tropicais. Repare que nesta região mais agraciada pelo sol, os efeitos de uma glaciação provocada pelo aquecimento global (sim, isso pode parecer estranho, mas pesquise a respeito, vai se surpreender) seriam menos sentidos nessa região, além de que alguns países de proporções continentais como a África e o Brasil, estão bem dentro dela.
          Opa, agora começamos a “entender” a fome na África ou as crises brasileiras que, surpreendentemente, não são tão intensas quanto poderiam. Poderíamos até começar a repensar o bordão de “Brasil, um país do futuro” sob nova perspectiva. Poderíamos repensar diversas coisas, desde as políticas sociais implementadas nas terras tupiniquins até a influência que o país tem adquirido em conselhos globais, como a ONU. Podemos viajar pelas possibilidades apresentadas pela globalização, pela internet e até mesmo pelas “experiências” políticas de união de blocos político-econômicos dispares como o Mercosul e a União Europeia.
          Sim, não há limites para as possibilidades criativas em cima do modelo apresentado, seja pela vertente positivista, com os melhores e maiores valores humanos preservados, como fez Arthur Clark, por exemplo, no excelente livro de TC chamado de “Richter 10” onde apresenta uma maravilhosa versão ao mesmo tempo catastrófica e otimista do futuro. Podemos ir na linha oposta e desconstruir a humanidade à moda de Kurt Vonnegut. Podemos ir onde a imaginação nos levar, ou não.
          Mas espere, por que motivos um autor se disporia a apresentar abertamente um veio rico, com todas as bases estruturais de execução, de como montar teorias da conspiração, sendo que suas ideias podem ser utilizadas pelos concorrentes sem que haja nenhum retorno financeiro para o mesmo de forma direta? Isso não lhe parece muito obscuro? Deve haver algo que não foi explicado adequadamente, há interesses escondidos nisso que precisam ser investigados. Está começando a se sentir manipulado por este autor em um nível que não compreende completamente, mas que já desconfia?
          Se você foi capaz de pensar nisso e releu tudo o que foi apresentado sob uma nova perspectiva, parabéns. Pode ser que tenha chego à conclusão de que aquele que ensina alguma coisa entende muito mais profundamente do seu objeto de estudo, do que aquele que acaba de aprender. Essa pode ser a sua “deixa” de saída, sistematicamente planejada desde o princípio. Ou pode ser que o objetivo tenha lhe escapado de alguma forma e vai tentar ir mais além do que foi apresentado, vai começar a estudar este autor e seus textos. Pode ser até que se torne um fã e passe a segui-lo e a apresenta-lo para outros na tentativa de descobrir outras vertentes para o que lhe escapou. O que posso acrescentar?
Nos vemos no topo. Ou não.

A CONSPIRAÇÃO AOS OLHOS DE QUEM VÊ - Danny Marks


Veja a parte 1 em Conspiração: Uma Teoria
Veja a parte 2 em Camadas (des)Informativas

          Como foi dito anteriormente, uma TC precisa ser simples, induzir algumas soluções parciais satisfatórias, ocultar camadas cada vez mais complexas, lidar com a realidade e com a verdade de forma que estas se tornem a sua base de sustentação adequadamente manipuladas para construir uma ficção que se assemelha muito à verdade e que, quando desvelada, ainda se mantém consistente em diversos níveis, como uma teia que mesmo tendo boa parte de sua estrutura destruída, ainda se mantém estável e cumprindo o seu papel.
          Dito dessa forma parece algo complexo demais, fruto da genialidade de algum arquiteto maquiavélico com capacidade de elaboração extremada. Não é. Qualquer um pode construir uma boa TC simplesmente a partir de elementos que são dados na realidade, acrescentando pitadas imaginativas de interpretação direcionada.
          Vamos fazer um exercício para comprovar isso. Vamos construir camada a camada uma trama complexa que se fundamenta em diversas teorias da conspiração possíveis, mas que neste caso serão totalmente inventadas por este autor para a demonstração prática de como é possível fazer. Obviamente, por mera questão de praticidade e agilidade, será apresentada apenas a estrutura elementar das diversas camadas, até porque não se deseja criar de fato conspiradores, mas estimular artisticamente as possibilidades criativas e argumentativas na criação de histórias fictícias com base na realidade observável.
          O melhor ponto de partida argumentativa para uma TC é justamente um cenário real onde exista algo nebuloso e não completamente explicável. No caso vamos nos apropriar do cenário político brasileiro da atualidade. Escândalos políticos são ótimos para se construir teorias conspiratórias, ainda mais quando envolvem denúncias de corrupção. Parece meio óbvio e ultrapassado, afinal, esse tipo de cenário é mais comum na história das nações que se desejaria reconhecer, mas vamos aplicar alguns elementos diferenciais.
          Pode-se começar de qualquer ponto a construção da TC, mas para atender os princípios da Universalidade e da Simplicidade é necessário que seja algo que afete a todos e que seja um tanto quanto óbvio, ao menos a princípio. Essa é a “isca” para que seja propagada e incite a busca das camadas ocultas. Então vamos usar o caso ainda corrente do impeachment do governo.
          Depois de um longo período em que um partido popular de ideologia socialista ter presidido o governo com pontos altos e baixos, como é comum a qualquer governo, há uma reviravolta estrondosa com denúncias e escândalos imensos afetando toda a economia e criando uma instabilidade política e social de proporções nunca antes vistas. “Nunca antes vistas” é uma frase recorrente nas teorias conspiratórias, dá uma ênfase na enormidade do problema apresentado e indica subjetivamente que, finalmente, toda a verdade está sendo revelada. É importante estar atento a essas frases de efeito porque boa parte das teorias conspiratórias utilizam discursos semelhantes com a manipulação das palavras de forma eficiente e sempre provocativas de estados emocionais. É preciso que seja provocada uma emoção forte na construção de uma TC, só a emoção consegue amortecer a razão de forma que se possa induzir comportamentos que, racionalmente, não seriam cabíveis. A TC precisa de paixão no seu desenvolvimento, na sua apresentação, na sua disseminação.
          Então temos lá o tal governo popular, que se torna populista na apresentação pelos seus adversários, com o detalhe de que há uma descaracterização seletiva. Isso é importante, note bem o termo, descaracterização seletiva. Como isso funciona? Em primeiro lugar se generaliza a atuação do governo apresentando todos os malefícios como sendo provenientes de uma única pessoa, partido ou ideologia, ignorando que em um sistema de governo democrático há a necessária coabitação de diversas ideologias e partidos que fazem acordos para que haja a chamada governabilidade, portanto, seja pela ação ou pela omissão, todos os partidos estão envolvidos nos atos apresentados categoricamente como sendo de um único governante ou partido. O mesmo se dá, pelo oposto, quando os resultados alcançados são desejáveis, não foram as coalizões dos partidos, até mesmo adversários, que promoveram o sucesso, foi apenas “O Governo”.
          Como já havia alertado, a ferramenta da TC funciona independente dos valores morais de quem as usa. Ferramenta não tem intencionalidade, podendo ser bem utilizada ou não na realização de um trabalho, de acordo com a habilidade e o interesse do executor e manipulador da mesma.
          Entra em cena a questão primordial da TC, o “motivo” que culminou com os fatos apresentados. “A quem interessa? ” No caso, quem teria interesse em destituir um governo eleito, ameaçando a economia, o sistema político, até mesmo as negociatas escusas que ocorriam? É preciso pensar que muitos das negociações mais sórdidas e mesmo as piores guerras entre bandidos se dá de forma oculta, justamente para que os vencedores, sejam quem forem, não fiquem expostos e possam continuar suas atividades tranquilamente. A lógica é que podemos não gostar da nossa posição no sistema, mas não podemos desmontar o sistema sem sermos afetados pela instabilidade e, pior, nada garante que o novo sistema que será construído necessariamente nos beneficiará de alguma forma. Por essa lógica é que é difícil desmontar um sistema de dentro, a implosão acaba afetando dramaticamente os que a provocam, e todos sabem que para desmontar um sistema de fora, é preciso que se tenha algo tão forte e poderoso quanto o que se quer destruir, ou até mais forte e poderoso. Troca-se seis por meia dúzia, como se diz normalmente.
          Essa verdade é, como em toda TC, parcial. Pode-se desmontar um sistema de dentro, ou mesmo substitui-lo completamente por outro, desde que seja feito de um nível superior. No caso o que é mudado é apenas uma camada, não o sistema inteiro, mas fica-se com a impressão que “as coisas mudaram”. E isso pode ser extremamente vantajoso para o próprio sistema, restabelece a confiabilidade que estava prejudicada, paralisa investigações mais profundas que podem ameaçar as estruturas mais fundamentais. Sacrificar parte do próprio corpo para conseguir sobreviver é uma estratégia utilizada na própria natureza com bons resultados. Como costuma-se dizer, o lagarto perde o rabo, mas preserva os dentes; na verdade, diante do predador mais forte, oferece o rabo como barganha e assim que o adversário pensa tê-lo preso firmemente, escapa deixando o rabo para trás. Isso deve provocar uma nova interpretação da famosa expressão conspiratória de “estar com o rabo preso”.
          Ok, voltando a nossa linha central, a quem interessaria a desestabilização de um governo e de toda a estrutura sócio-politica? Em primeiro lugar podemos pensar em um governo estrangeiro, seria o mais comum, afinal é obvio que um adversário forte é temerário e a desestabilização provoca fraquezas, mas cuidado com as obviedades em uma TC, elas costumam ser projetadas para serem assim. Também podemos pensar em setores internos do sistema, como uma revolução, sociedades secretas anarquistas, sociedades políticas desfavorecidas e pouco atuantes no cenário estabelecido, até mesmo o crime organizado, as máfias corporativas ou não; qualquer um desses casos obteria grandes benefícios com o enfraquecimento e desmonte do sistema. O caos cria oportunidades, isso é um fato trágico na história da humanidade. Não se observa maior avanço tecnológico do que em períodos de instabilidade e até mesmo de guerra declarada e não apenas pelos agentes óbvios que subsistem de ganhos diretos relacionados, como produtores de armas. Muitos dos avanços da atualidade em todas as áreas, são frutos bastardos dos esforços da Segunda Grande Guerra, por exemplo.
          Pense no fusquinha, na internet, na medicina nuclear, na exploração espacial, nos satélites, nos antibióticos, nas vacinas, nos sistemas gerenciais. Seja onde for que vá buscar as raízes de alguma tecnologia que avançou rapidamente, vai acabar encontrando fins bélicos. Grandes empresas incentivam abertamente a agressividade nos negócios como incentivadora de avanços. Aparentemente a criatividade se torna mais forte em períodos de crise generalizada. A crise, o caos, as desestruturações, geram bons negócios.
          Estamos falando de Teoria da Conspiração, certo? Pois então é preciso entender que esse discurso é em si, uma, globalmente aceita, e tem bases na realidade como é típico de toda bem construída TC. É inegável que a sobrevivência é um grande estimulador da criatividade, mas a competição não precisa implicar em belicismo, haja vista que o esporte é uma forma de competição que, preservados os seus princípios básicos de superação pessoal, não tem características bélicas. Portanto, cuidado quando incorporar um discurso manipulador como o apresentado, sem que se perceba está fazendo parte de uma grande conspiração que tenta justificar o injustificável sob qualquer outro prisma.
          Voltando ao nível primário da nossa TC imaginária. A instabilidade que constantemente vemos noticiada, poderia ter por base tanto uma reforma política desejada pelos próprios políticos, estimulada por empresários, desejada por segmentos organizados oriundos da sociedade interna ou até mesmo por interesses de outros governos. A instabilidade obriga mudanças, obriga reinterpretações, obriga repactuações e negociações. A instabilidade prolongada causa danos e, em algum momento, precisa ser revertida. Seja em um novo rumo, seja nos mesmos moldes, mas com aparência de mudança, do contrário torna-se autoimune, agride a si mesma e, se não for tratada rapidamente, implica na morte de toda a estrutura que pretendia favorecer.
          Só essas bases apresentadas já dariam boas histórias conspiratórias, mas vamos aprofundar um pouco mais. Vamos colocar elementos geopolíticos mais amplos. Continue acompanhando neste mesmo local a continuidade deste trabalho e descubra como acrescentar mais camadas na Teoria da Conspiração, integrando-as no que já foi apresentado e ampliando o foco ao mesmo tempo que descemos ao mais profundo subterrâneo do indizível. 

Veja a parte final em Pirâmide da Teoria da Conspirção

segunda-feira, 27 de junho de 2016

Aforismos de Criminal Minds 11ª Temporada



11X01 – The Job

O prazer no trabalho aperfeiçoa a obra.
Aristóteles

Coragem é graça sob pressão.
Ernest Hemingway

11X02 - The Witness

É nos momentos de decisão que seu destino é moldado.
Tony Robbins

O mundo é tão imprevisível. As coisas acontecem de repente, inesperadamente. Queremos achar que temos controle da nossa existência. De um jeito temos, de outros não temos. Somos governados por forças do acaso e da coincidência.
Paul Auster

11X03 - ´Til Death Do Us Part

E não ache que pode direcionar o curso do amor, pois se o amor julga-lhe digno, ele direciona o seu curso.
“O Profeta” – Gibran Khalil Gibran

Considero verdade o seguinte: Sinto quando mais lamento que é melhor ter amado e perdido do que nunca ter amado.
Alfred Lord Tennyson

11X04 - Outlaw

Todos os pecados tendem a ser viciantes e o ponto terminal do vício é a condenação.
W. H. Auden

11X05 – The Night Watch
Fantasmas foram criados quando o primeiro homem acordou durante a noite
J. M. Barrie

Crescem mais coisas no jardim do que o jardineiro sabia ter plantado
Provérbio Espanhol

11X06 - Pariahville

Juro do fundo do meu coração quero ser curado, quero ser como outros homens, não esse pária que ninguém quer.
E. M. Foster

Manter-se indiferente aos desafios que enfrentamos é insustentável. Se o objetivo é nobre, se, de qualquer forma, se realiza em nossa vida é irrelevante. O que devemos fazer, no entanto, é nos esforçarmos e perseverarmos e nunca desistirmos.
Dalai Lama, o 14o

11X07 – Target Rich

Somos todos tubarões circulando e esperando rastros de sangue aparecerem na agua.
Allan Clark

Para um pai nada é mais querido do que uma filha.
Eurípedes

11X08 – Awake

Pode me prender, pode me torturar, pode até destruir este corpo, mas você nunca irá aprisionar a minha mente.
Mahatma Gandhi

A culpa é, talvez, o companheiro mais doloroso da morte.
Coco Chanel

11X09 – Internal Affairs

O inimigo está preso. Está junto com a nossa luxuria, nossa insanidade, nossa própria criminalidade, que devemos conter.
Marcus Tullius Cicero

11X10 – Future Perfect

O relógio fazia barulho. Joguei-o fora. Ele me assustava quando fazia barulho.
Tillie Olsen

A primeira condição para a imortalidade é a morte.
Stanislaw Lec

11X11 – Entropy

Da mesma forma que aumento constante da entropia é a lei básica do universo, também é a lei básica da vida lutar contra a entropia.
Vaclav Havel

11X12 – Drive

Educar uma pessoa apenas no intelecto, mas não na moral, é criar uma ameaça à sociedade.
Theodore Roosevelt

O ponto alto do homem é, e não tenho dúvida, quando se ajoelha no pó e bate no peito e conta todos os pecados de sua vida.
Oscar Wilde

11X13 – The Bond

O coração de mãe é um abismo profundo, no fundo do qual sempre existe o perdão.
Honoré de Balzac

A Influência de uma mãe na vida de seus filhos não pode ser mensurada.
James E. Faust

11X14 – Hostage

Pela vontade estais perdidos, pela vontade estais achados, pela vontade, livres, cativos e amarrados.
Angelus Silesius

Vingança é um ato passional, represália da justiça.
Samuel Johnson

11X15 – A Badge and a Gun

A escuridão sempre mente
Anthony Liccione
O Poder é ter o medo de outra pessoa em nossas mãos e mostra-lo à pessoa.
Amy Tan

11X16 – Derek

(Não houve aforismos neste capítulo)

11X17 – The Sandman

Os pais são os ossos nos quais os filhos afiam os seus dentes
Peter Ustinov

Por sorte estou são depois de tudo que passei. Por enquanto, a vida tem sido boa para mim.
Joe Walsh

11X18 – A Beautiful Disaster

(Não houve aforismos neste capítulo)

11X19 – Tribute

A originalidade não é nada além de uma imitação judiciosa.
Voltaire

Andar com um amigo no escuro é melhor que andar sozinho na luz.
Helen Keller

11X20 – Inner Beauty

Imagino que um dos motivos para as pessoas se agarrarem aos ódios delas, é porque sentem que quando o ódio acabar, serão forçadas a lidar com a dor.
James Baldwin

À medida que o amor cresce em você, a beleza também cresce. Pois o amor é a beleza da alma.
Santo Agostinho.

11X21 – Devil’s Backbone

Não sabia que quando dá meia-noite todos precisam retirar as máscaras?
Soren Kierkegaard

Ninguém realmente conhece outros seres humanos, o melhor que podemos fazer é supor que sejam como nós mesmos.
John Steinbeck

11X22 – The Storm

O mar é perigoso e suas tempestades são terríveis, mas isso nunca foi razão suficiente para permanecer em terra firme.
Ferdinand Magellan

A linha entre o bem e o mal passa pelo coração de todo ser humano.

Alexandr Solzhenitsyn

CAMADAS (des)INFORMATIVAS - Danny Marks


Veja a parte 1 em CONSPIRAÇÃO - UMA TEORIA 

          “E conhecereis a verdade, e a verdade voz libertará” (João 8:32).
          Há milênios que o pressuposto do conhecimento da verdade traz a libertação, mas há alguns problemas nisso. O primeiro é definir o que é verdade.
          A Filosofia, mãe de todas as ciências, tenta até hoje chegar a um conceito que explicaria o que é a verdade. Dependendo de como se busca o conceito do que seria a verdade, ela assume aspectos diferentes e, ainda assim, válidos. Por exemplo: a verdade pode ser material, formal, analítica, sintética ou sofisma.
          Para complicar, até mesmo o que concebemos como realidade é subjetivo, depende dos sentidos, da interpretação destes por um conjunto de interações no cérebro, e por aí vai.
          O mesmo ocorre com a liberdade. O que seria? Não há uma conclusão final, porque na maioria das vezes chega-se a uma liberdade parcial. Então, do que a verdade nos libertaria? Para quê?
          O que isso tem a ver com a Teoria da Conspiração? Basicamente, tudo.
          Uma TC não lida necessariamente com a mentira, ao contrário, as melhores lidam justamente com a liberação da verdade. Uma mentira é difícil de ser mantida por muito tempo, por um grande número de pessoas. Quanto maior o tempo e o número de pessoas envolvidas, mais breve será a mentira e mais rapidamente desmascarada. Por outro lado, uma verdade parcial, apresentada de forma a formar conceitos incorretos, pode durar longamente e se tornar ainda mais forte com o número de pessoas que a propagam.
          Uma meia-verdade é muito mais eficiente que uma mentira, mais difícil de ser desvelada, mais forte e, principalmente, melhor aceita. Isso porque há fatos que demonstram a verdade apresentada, afinal é uma verdade, mas por ser incompleta, manipulada, indutora, serve a interesses de quem a manipula, não é livre e não liberta ninguém, na verdade, acorrenta ainda mais forte.
          Assim como a verdade é uma construção que pode ter camadas específicas ou camadas amplas, onde novos conhecimentos se somam aos já adquiridos; a TC também tem camadas que podem ser bem rasas, bem específica, e se completam e se reforçam em esquemas muito mais complexos.
          Na verdade, quanto mais complexo o mundo se torna, mais fácil se torna construir uma Teoria da Conspiração. Quanto mais informações são divulgadas, mais complexo se torna descobrir as meia-verdades que abrigam, as manipulações que escondem ou que provocam. Isso já está arraigado na coletividade, entranhado no sistema amoral da construção da sociedade.
          O que são as lendas, as histórias infantis, as ideologias religiosas ou não, os discursos motivacionais, etc., senão meia-verdades que se utilizam para atingir fins desejáveis? Quem não se sentiu confortado por uma “mentira sincera” diante de algo trágico e insuportável? “Vai melhorar”, “Não tema, vai dar certo”. Como assim? Como fazer afirmações que não podemos provar, até que as façamos acontecer? O que é omitido é a verdade que “Se não melhorar, não vai precisar se preocupar mais, pois terá sido o fim”, então é preciso acreditar que sim, as coisas podem estar ruins, mas enquanto não se desistir, há esperanças de que melhorem com o nosso esforço. A partícula da verdade liberta do desastre total e manipula em direção a solução, tornando uma meia-verdade em um fato utilizando as ferramentas da TC.
          Isso nos leva a pensar que o objetivo de toda TC é a sobrevivência daqueles que se servem dela, independente dos valores morais que os motivam. Portanto a TC é uma ferramenta intelectual, não um organismo com vontade própria com fins específicos e objetivos. É uma ferramenta de sobrevivência e, portanto, extremamente versátil.
          O mais interessante é que, por ser uma ferramenta de sobrevivência, está sujeita às leis da evolução, ou seja, precisa se adaptar e evoluir ou será extinta. Isso é facilmente comprovável quando se faz uma pesquisa histórica. Nada melhor para determinar a evolução e adaptação de alguma coisa que fazer uma pesquisa histórica.
          A Teoria da Conspiração está tão entranhada no desenvolvimento das sociedades que é impossível separa-las. Grupos, cidades, reinos, nações, sociedades inteiras foram fundadas e derrotadas por conspiradores. Conspirações ergueram e derrubaram impérios, basta ver o caso dos Romanos, dos Gregos, na antiguidade. Casos como o de Cortez são emblemáticos, onde a derrocada de um império se deu pela manipulação dos próprios pilares que o mantinham. As máfias da modernidade e as sociedades secretas são exemplos dessas manipulações de mão dupla.
          Chegamos a época em que a informação está de tal forma acessível e disseminada pelo mundo que é praticamente impossível esconder a verdade, a menos que seja por baixo de outras verdades, pela intoxicação de verdades seletivas ou insuportavelmente realistas, pela enxurrada constante de verdades que anestesia e impede um raciocínio prolongado.
          Na era da informação que prometia unir o mundo, finalmente acessível a todos, sofremos cada vez mais um isolamento, uma desesperança. Somos cada vez mais manipuláveis pelas tendências e pelos “movimentos coletivos”, nossas vozes se perdem no grito da multidão. Criamos voluntariamente barreiras contra o excesso que nos inunda e nos sufoca e, deixamos brechas abertas por informações livremente apresentadas para nos sentirmos parte de alguma coisa que se fragmenta na imensidão da coletividade. Quanto mais fazemos parte de algo maior, menor nos sentimos diante do todo, desvalorizando o nosso próprio potencial de intervir.
          O que uma célula em um corpo pode fazer para alterar a realidade do todo? Em uma palavra? Contaminação. É assim que um câncer se forma e se dissemina. É assim que um vírus derrota um organismo bilhões de vezes mais complexo e capaz de feitos incomparáveis.
          É preciso aprender como funciona essa ferramenta evolutiva, a Teoria da Conspiração, para poder impedir que se torne um câncer, e se torne um fator de cura; para impedir que se torne um vírus que destrói o hospedeiro, e se torne uma vacina que impede que fiquemos doentes.
          E assim encerramos esta breve explanação sobre as bases da Teoria da Conspiração e passamos a apresentar algumas possibilidades, também teóricas, da sua aplicação. Podemos ser autores, atores ou figurantes, mas não podemos nos furtar a sofrer as influências dessa ferramenta que, de alguma forma, definirá os rumos futuros da humanidade, como vem fazendo desde os primórdios

quinta-feira, 9 de junho de 2016

Conspiração: Uma Teoria – Danny Marks

          Vivemos na era da informação, portanto era de se esperar que as Teorias da Conspiração cairiam em desuso tanto no mundo real quanto na sua interpretação, o mundo das artes. Só esta frase já deveria denunciar o absurdo da afirmação, pois, em essência, é uma teoria da conspiração.
          Para entender o princípio de uma Teoria da Conspiração (TC) é preciso mergulhar em uma característica da mente humana, o reconhecimento e interpretação de padrões a partir de análises pré-concebidas. Essa ferramenta evolutiva é que permitiu a sobrevivência da espécie habilitando os portadores dessa característica de sobreviver em um mundo em que não havia tempo hábil para analisar se um perigo era real ou imaginário partindo de informações mínimas, como um som de galho quebrando, um arrepio instintivo, uma ausência de sons da natureza, etc.
          O predador estava sempre por perto, mas nem sempre visível, e poderia em um golpe repentino acabar com os menos vigilantes e desconfiados. Essa paranoia natural da vigilância influenciou a evolução humana de forma que pudesse sobreviver, mas também criou ferramentas de controle, de manipulação, de ajustes da própria condição humana.
          Quando a sociedade como a conhecemos foi instituída, os predadores mudaram e se adaptaram. A Polis obrigava a um novo tipo de relacionamento de comunidade que obrigava a determinadas regras públicas, a política, a arte de conviver com os semelhantes.
          Como todas as coisas que sobrevivem, sejam organismos vivos ou ideias, essa ferramenta evolutiva também evoluiu e adaptou-se ao meio. A história humana nos conta sobre os diversos complôs, esquemas subterrâneos que visavam alterar a ordem estabelecida, mudar os agentes supremos e recriar sociedades e parcerias. Como não poderia deixar de ser, a arte sempre buscou apresentar e reinterpretar a visão de mundo, permitindo revelar o que sempre se buscou ficar oculto e, para tanto, utiliza-se muitas vezes dos próprios princípios que pretende denunciar, até para desvelar melhor os seus mistérios.
          As primeiras TC do mundo artístico eram transmitidas de forma oral, ganhavam corpo e formas diversas na tradição cantada e contada, criando o que hoje chamaríamos de “lendas urbanas”. Eram excelentes formas de gerenciamento, transmissão de conhecimento e preparação para o difícil mundo de conviver com o poder subjetivo e efetivo a que a grande maioria das pessoas estava submetido. Mascaradas em mitos, fábulas, histórias de aventura e histórias morais, revelavam o que de outra forma não poderia ser dito, brincando com os medos e as verdades estabelecidas, encantando da mesma forma os algozes e as vítimas e, desta forma, sobrevivendo a qualquer tipo de controle, embora sendo ferramentas de controle.
          Neste trabalho serão reveladas algumas características básicas das TC e como são utilizadas para diversos fins, em especial a construção de textos literários ao longo dos tempos e suas diversas possibilidades e intersecções.

Estrutura de uma Teoria da Conspiração.

          Desde a mais simples até a mais complexa TC é necessário que haja uma estrutura elementar, que sustente de forma adequada todo o conjunto de intencionalidades e induções a que se destina. Sem esses elementos fundamentais teremos qualquer coisa semelhante, mas nunca uma teoria da conspiração.
          — Princípio da Universalidade – para funcionar adequadamente, uma TC precisa ser universal, ou seja, abranger de alguma forma conceitos que atinjam de igual forma todo o grupo ao qual atende.
          — Princípio da Realidade – sempre terá suas bases, por mais fantasiosos que forem os desenvolvimentos posteriores, na realidade e serão facilmente comprováveis os seus fundamentos mais poderosos. Sem esse apoio da verdade comprovável, tende a desmoronar sobre o peso de suas argumentações.
          — Principio da Simplicidade – Talvez o mais importante para que seja difundida, se baseia no fato de que precisa ter aceitação pelo maior grupo de indivíduos afetados de forma rápida. Portanto, por mais complexa que seja a TC ela será dividida em camadas consecutivas de forma que haja um aprofundamento gradual possível dos conceitos aplicados de forma que sempre pareça acessível aos que tiverem o interesse de mergulhar pelos seus subterrâneos. Qualquer indivíduo pode ir descortinando os seus segredos e “vendo” o que estava oculto aos demais. Esse fator de sedução e diferenciação do adepto contra o resto da sociedade o torna um conspirador favorável ou contrário, dando uma aura de mistério e carisma insuperável.
          — Principio da Solução – Aqui reside a força da TC. A capacidade de qualquer conspirador, favorável ou não, de solucionar os seus mistérios, ainda que de forma parcial. Funciona como um labirinto onde possibilidades diversas conduzem a finais alcançáveis mediante as capacidades dos investigadores. Todos que se dispuserem a buscar, encontrarão algo no final do percurso, ainda que seja um engodo criado apenas para satisfação dos que tentam destruir a estrutura principal. Uma boa TC tem que ser trabalhada como uma teia em que as estruturas secundárias suportem rompimentos de grandes seções sem desmontar completamente, até mesmo usando esse desmonte como um mecanismo de proteção e aprisionamento do investigador.
          Existem outras estruturas que poderiam ser descritas, mas apenas utilizando os Princípios elencados já é possível ter uma ideia de como funcionam.

LENDAS URBANAS

          Algumas TC se tornam clássicos populares, costumam ser simples e divertidas em suas formas didáticas de inserir valores relativos para a sociedade. É o caso, por exemplo, do “Pipoqueiro do Mal”, aquela figura simpática que fica em lugares públicos, normalmente próximo a escolas infantis, que adiciona drogas viciantes no seu produto, obrigando os incautos a comprarem sempre mais para suprir as necessidades do vício.
          Os fatos reais são fundamentados na oferta de produtos viciantes, que tornam uma ação altruísta algo nocivo. Brinca com a questão de que devemos desconfiar de tudo que nos é oferecido sem custo. Sobrevive na realidade dura das cidades onde traficantes verdadeiros oferecem a “prova” das drogas ilícitas para depois cobrarem altos custos dos viciados. Apesar disso é desmontada com facilidade diante de um raciocínio lógico: O custo da droga misturada à pipoca é muito superior a qualquer quantidade de pipoca vendida posteriormente.
          Mas o raciocínio se sustenta pela forma da metáfora, onde a “pipoca” pode ser qualquer coisa, desde o brinde de um pacote de figurinhas que só se justificam na compra do álbum e nas figurinhas que terão que ser compradas para o completar, até um animal de pelúcia na aquisição de um carro zero km.
          Esse princípio é o da “isca”, usa-se algo de valor intrínseco para atrair um consumo não desejado de algo que supera e inclui o valor do brinde ofertado. Quem nunca acabou “fisgado” por algumas revistas “grátis’ na assinatura dos novos exemplares, ou por uma “prova” de algum produto se entrar na loja para comprar algo? Esses recursos são amplamente utilizados e permanecem vivos porque produzem efeitos válidos.
          A lenda urbana do “Pipoqueiro do Mal” atinge o Princípio da Universalidade porque age diretamente na questão dos ícones da infância, qual a criança que não gosta de pipoca? O pipoqueiro está presente em todas as atrações mais divertidas, do circo ao cinema, do passeio no Zoológico à praça com brinquedos.
          O Princípio da Realidade é satisfeito pela questão de que não se sabe o caráter da pessoa que vende a pipoca. Não há como definir se aquela pessoa é alguém “do bem” só pelo ofício que exerce. Não se exige qualquer especialidade para exercer a profissão de pipoqueiro e é, normalmente, algo que passa uma imagem de inocência e confiabilidade.
          O Princípio da Simplicidade e o Princípio da Solução são satisfeitos pelo fato de que seus elementos compositores são tão profundos quanto se quiser aprofunda-los. Como foi dito anteriormente, seria ridículo contaminar as pipocas com drogas para aumentar o consumo, o custo x benefício seria comprometido, portanto a teoria se desmonta. Porém, por ninguém desconfiar do singelo pipoqueiro, ninguém vai pensar que ele pode ser um espião vigiando abertamente um local ou pessoas, ou mesmo que ele pode ser algum agente interessado em causar o pânico contaminando as pipocas com algum vírus que se disseminaria rapidamente pelo agrupamento. Poderiam ser inseridos contextos de complexidades diversas a partir do inocente pipoqueiro, e ainda teriam a proteção do “desmonte” programado. Quem iria acreditar no pipoqueiro envolvido em uma grande conspiração?
          Basta lembrar que um bom labirinto não apenas torna os caminhos semelhantes, mas induz a determinadas saídas e soluções que “desvelam” seus segredos, enquanto na verdade estão apenas escondendo à vista de todos o verdadeiro tesouro que guarda.

          Na TC não apenas o que é oculto tem importância, mas também o que é revelado, a forma como é revelado e quando é revelado, que muitas vezes servem de truques ilusionistas para desviar a atenção enquanto a verdadeira ação está acontecendo sob os olhares de todos, como um truque de mágica, até que seja tarde demais para impedir-se os efeitos. Essa estratégia é chamada de Camada (des)Informativa e trataremos dela a seguir.

sexta-feira, 3 de junho de 2016

Brilliant Performance – Danny Marks (Análise de Vídeo)

       
          Fazer humor é algo difícil, todo humorista sabe disso. Se for um humor crítico, com uma ironia fina, mais complexo ainda. Mas o “Sr X” (infelizmente não consegui descobrir o nome dele) tem a habilidade e a inteligência para provocar o público sem criar uma rejeição. Esse primeiro instante é que demonstra para o profissional se conseguiu conquistar ou não o público.
          Observe que ele já provoca uma obrigatória percepção do público na escolha das roupas, uma camiseta listrada, blazer e calças de um tom neutro, ligeiramente folgadas, mas não deselegante. Para completar, tênis, um toque anárquico na relaxada sobriedade das vestes. Essas roupas folgadas e destoantes, que lembram um relaxamento e uma formalidade em algum nível mais inconsciente, estão diretamente vinculadas ao tipo de vestimenta que um palhaço de circo usaria. Essa tradição de vestuário que satiriza a sobriedade está vinculada aos primórdios da arte circense que buscava ganhar a vida ironizando justamente o público que pagava pela apresentação, os nobres das cortes.
          Os olhos destacados por delineador que realçam-lhe as expressões também remetem a esta tradição circense, mas avançam pelo arquétipo do mímico, que tenta transmitir o seu texto apenas com as expressões faciais e corporais. Estabelece-se dessa forma uma cadeia de memórias primordiais do humor que, impactada pelo primeiro momento de estranhamento, busca nas memórias mais primordiais o reconhecimento do padrão. O choque inicial é reforçado pelo inusitado uso de uma fita preta servindo de mordaça.
          A fita preta adesiva da mordaça é emblemática por si só, simboliza a impossibilidade de falar, a censura, a coerção sofrida. Mas o fato de estar com as mãos livres e a mordaça não ser removida, torna mais emblemáticos e assume diversos papeis, de acordo com o contexto, para além do impacto inicial. Em nenhum momento será removida e, portanto, obriga o leitor a prestar atenção a todos os outros sinais codificados pelo corpo e pelo olhar. Note que uma simples fita preta sobre a boca em tamanho suficiente para parecer uma tarja preta (e isso já nos levaria por outros caminhos de análise) de censura, ultrapassa o efeito do impacto inicial, da primeira visão, e por não ser removida nem mesmo para responder a perguntas que são feitas pelos jurados (as autoridades instituídas) passam a representar mais simbolismos.
          Ao não responder aos jurados devido a tarja preta, a censura passa a ser uma crítica, inverte a função do que é proibido pelo outro para o que não se permite dar ao outro, "pensem o que quiserem", gestos e olhares dão indicação dessa postura. A questão é reforçada pelo ato de testar o microfone com a mão e, percebendo que está ligado, afastá-lo com um gesto de inconformidade.
          Entra a música e o Sr X veste luvas de cozinha, a música inicial decresce em desafino e se inicia uma trilha sonora romântica enquanto as luvas são erguidas até a altura do olhar e se transformam em toscas marionetes com o simples fato de voltar as mãos para fora e expor a face interna das luvas, ornadas com olhos estilizados. Os polegares tornam-se as bocas que cantam a canção.
          Novamente vemos uma referência circense aliada ao teatro de marionetes. O “manipulador” observa o boneco junto com a plateia, mas reage como se cada boneco tivesse uma individualidade e até se “espanta” com os mesmos. O simbolismo resgatado pela música é o do romantismo moderno, detalhes como os punhos de bolinhas coloridas reforçam esse simbolismo de “amor de arco-íris”. Mas o manipulador parece não gostar do que está acontecendo, seu olhar assustado e os gestos faciais de repúdio são contraditórios com o público que entra no clima romântico e balança os braços no alto ao sabor do romance. A crítica sutil se dá por um breve instante em que a “marionete masculina” volta a ser brevemente uma mão enluvada a coçar a virilha do artista, mas retorna o seu papel a tempo de cantar o dueto e esboçar o “beijo” que finaliza a apresentação do primeiro quadro. O artista vai afastando sutilmente para um dos lados as marionetes improvisadas ao mesmo tempo que desvia o rosto do ato final como a demonstrar repúdio ao “beijo” das marionetes. Nesse momento é possível ver um toque sutil, o cabelo bem penteado na frente, tem um estudado ar punk, espetado, na parte de trás.
          A plateia vibra, a música volta a ter um toque circense enquanto o Sr X guarda as luvas em uma bolsa e retira o seu próximo “personagem” iniciando uma outra modalidade de dueto com marionete, em que o artista se apresenta metade no papel masculino e metade no papel feminino.
          Mas desta vez nota-se que a “mulher” não tem cabeça, apenas o par masculino a possui. A música circense desafina e é substituída por um outro dueto, mas o tom desta vez é sensual, o que combina com o “vestido” vermelho da “dama”.
          O “casal” passa a dançar, mas o “cavalheiro” passa a se interessar por outro alguém, e é “repreendido” pela “dama”, obrigando-o a olhar apenas para ela que continua a acaricia-lo durante a dança.
          O “cavalheiro” desliza as mãos pelas costas da moça em direção às suas nádegas, mas esta imediatamente o repreende, forçando a “mão boba” a subir. Ele insiste, ela volta a reprimir. Ele a engana com um blefe e ela acaba colocando a mão dele onde este queria. Vencida a resistência inicial, ele avança e tira o sutiã vermelho da “moça” e simulam um deitar-se terminando a apresentação.
          O público e os jurados vão ao delírio.
          Meus leitores também. Ora bolas, isso não era uma análise? Então, é preciso destacar os elementos analisados para que se perceba qual o raciocínio utilizado para a “leitura” analítica. Essa foi a primeira parte.
          A segunda parte consiste em estruturar o argumento já ensejado na própria apresentação dos elementos estudados. Quando apresentei o texto já introduzi a ideia de que o trabalho do artista é na linha do humor crítico, com o uso de ironia fina. Como se justifica isso?
          Primeiramente pela mordaça que brinca com a questão da censura, do interdito, como diria Foucault. Se há algo que não pode ser expresso de forma direta a comunicação fica interrompida, a mensagem fica suspensa entre o emissor e o receptor, o interdito. Porém, não significa que é extinta, apenas que assume no receptor uma função de reverberação, ou seja, o receptor passa a “produzir” a mensagem que recebe e isso cria um outro modo de comunicação que é mais interno. Algo como um diapasão que faz vibrar uma taça de cristal pela sintonia vibracional. Neste caso são os arquétipos, os conceitos internalizados, que reverberam como cristal ao serem provocados.
          Portanto, não há como repudiar o que não foi “dito”, mas foi “interpretado” e, por não ser socialmente aceito, não pode ser “acusado”, sob pena de revelar o acusador, mais que o acusado.
          Essa linha de humor lida com os conceitos e preconceitos mais estruturais da sociedade, aquilo que não é dito, mas está presente e cria raízes profundas alterando as percepções. Somente uma sutileza e habilidade extrema conseguem “brincar” com sentimentos profundos sem provocar uma explosão, ao contrário, fazendo com que transbordem e permitam um relaxamento da repressão que sofrem. Esse relaxamento é o humor conciliatório provocado.
          Mas, dirão alguns, como o artista pode expressar sua opinião se apenas o outro vai “produzir” a mensagem. Simples, pelo discurso indireto, subliminar. As expressões de repúdio ao amor romântico do primeiro quadro são substituídas pelo envolvimento no amor sensual do segundo quadro. A mordaça assume o seu papel primordial no contexto transformando o artista na representação da sociedade que repudia uma faceta do amor e valoriza a outra, mas não de forma aberta, apenas fingindo aceitar as duas. Essa é a crítica sutil, a condenação não dita, a aceitação não formal, o interdito provocativo que, embora se expresse abertamente de uma forma, no íntimo se revela totalmente oposto.
          O fato de que as “marionetes”, a “dama” e o artista são apenas aspectos da mesma coisa e da mesma representação nos dá a leitura direta da crítica social que apresenta, pela ironia fina, aquilo que de outra forma nos pareceria agressivo e deveria ser repudiado firmemente, mas pela obra artística passa a ser aceito permitindo que seja reinterpretado e, portanto, analisado.
          Obviamente esta é uma análise superficial, com poucos elementos de interconexão, mas o objetivo é justamente esse, demonstrar que o aprofundamento de uma obra de arte se estende ao limite que o leitor quiser dar e sempre haverá algo que possamos aprender, e nos divertir no processo. Quer um exemplo? Por que luvas de cozinha? E abrem-se novas possibilidades interpretativas. Até a próxima.

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