terça-feira, 24 de maio de 2011

FRIO - Rogério Camargo

Intensa, enorme reação ao frio.
Não gosto dele e deixo isso bem claro
tossindo seco, como num disparo
contra um inimigo em pleno cio.

Assanhadíssmo e com muito brio,
ele quer tudo, por demais avaro
de todos os espaços que declaro
serem ainda meus, num desafio.


É tudo dele e eu não me conformo
nas aparências, porque o corpo grita
como que estando à beira de um martírio.

Com isso o cotidiano bom deformo
e a vida, quase sempre tão bonita,
sujeita-se a seguir por um delírio.

ROGÉRIO CAMARGO
24.05.2011

DUAS ÁRVORES - Rogério Camargo


São duas árvores entrelaçadas,
uma bastante velha, outra nem tanto,
que vivem juntas, como por encanto,
numa clareira quase separada. 

O seu silêncio, uma linguagem dada
à sensibilidade sem espanto,
é cobertura mas não é um manto
                                                     que encubra essa beleza recatada.

São duas árvores num só sorriso
e diante dele tudo que eu preciso
é ficar quieto como elas estão.

Qualquer desejo em direção à posse
é dar à vibração morte precoce,
quando ela ainda está no coração.


ROGÉRIO CAMARGO
21.05.2011

sexta-feira, 6 de maio de 2011

Festa na Floresta - Danny Marks

             A Cuca estava furiosa, correndo atrás do Saci, quando deu de cara com o Lobisomem.
            — O que é isso, comadre? — Perguntou Lobisomem
            — Este moleque safado deve ter aprontado de novo! — gritou a Cuca.
            — Eu não fiz nada!!! Não desta vez... — defendeu-se o Saci que pulava sem parar.
            — Então onde está o meu convite? —
            — Que convite, comadre?
            — É, que convite, bruxa?!
            — Ora, o convite para a Festa na Floresta.
            — Eu não peguei!!!
            — Eu não recebi convite nenhum. Que Festa na Floresta?
            — Vocês não sabem? Eu vi no meu caldeirão. Todos estão lá.
            — Então por que não fomos convidados?
            E colocaram-se a conversar sobre a discriminação de não convidarem tão ilustres 
sozinha.
            — É mesmo? — riu o Saci — Não vejo mais ninguém...
            — Então olha de novo, Saci. Eu estou bem aqui! — disse o Príncipe Encantado mudando de sapo para homem.
            — Nós vamos entrar e está acabado!!! — disseram juntos o Saci e a Cuca.
            O Príncipe, puxou a espada e a Chapeuzinho se armou das coisas que trazia na cesta.
            A luta já ia começar mas eis que o Lobisomem se meteu no meio da turma.
            — Esperem! Não viemos aqui para brigar, queremos apenas o que é nosso.
            — Vocês sempre estragam a festa. Aprontam travessuras. Assustam as pessoas. Por que deveríamos deixá-los entrar?
            — Ora, meu caro Príncipe, o que seria das histórias infantis se não houvesse o vilão? Quem serviria para representar os problemas da vida? Mostrar o Certo e o Errado? Quem poderia causar medo de correr para os braços da mãe e ficar aconchegadinho? Se não fosse por nós, os Vilões, não haveria história alguma para contar.
            Todos ficaram calados, pensativos. Até que o Lobisomem estava com a razão. E se os bonzinhos não dessem oportunidade para entender-se com os outros como saber se eles não poderiam tornar-se bons também?
            — Então está bem — disse o Príncipe — podem entrar na festa. Mas Comportem-se!!!
            — Claro que vamos nos comportar — disseram os três convidados de ultima hora — Vamos nos comportar como os Vilões que somos...
            E correram para a Festa.personagens para uma festa tão importante.

PROVAS - Rogério Camargo

Quando a prova do amor está no sexo,
bem pouco resta pro que não rasteja.
Vais me apontar a sombra do complexo
enquanto eu rio, quanto mais não seja. 

Côncavo em êxtase pelo convexo,
como o perfume alegre da cereja.
A força delicada entende o nexo
mas deixa o cão entregue ao que fareja.

O que é da terra à terra fica preso,
não há porque se por triste ou surpreso
por existir coerência no universo.

Somando dois e três se encontra cinco,
ainda que a ilusão dedique afinco
para se convencer tanto do inverso.

INSANIDADE - Lariel Frota

Dormiu embalado por imagens lindas:principe,princesa de branco, carruagem dourada, bandeirinhas alegres, trotar de cavalos no asfalto: pocotó...pocotó...pocotó....
Acordou pensando estarem um pesadelo.
Não, tal qual as núpcias, a morte cantada em alegria insana, é real. O sangue azul no riso falso, o outro, com cheiro de pólvora com o sal do mar!!!

O QUE É MAIS ÚTIL - Rogério Camargo

Na dúvida: o que é mais útil fazer?
Atentar sempre para esse momento,
seja qual seja o acontecimento,
até da fuga do que há pra ver. 

A vida é sempre ali – e conhecer
o que aparece no aprofundamento
do que se mostra a um olhar atento
é bem mais vivo do que reviver.


A reconstituição pode ser boa,
pois tudo é bom quando se dá honesto,
mas também pode ser esforço atoa.

Reconstituir reeditando os fatos
é quase compulsão, e nesse gesto
temos o mesmo com o mesmo status.

03.05.2011

BASTANTE - Rogério Camargo

Não nos basta somente intenção,
por melhor que ela seja ou será.
Fantasia, imagem-ação:
muito aquém da verdade que há. 

A vontade é o poder e mais não
pode dar a verdade e não dá.
Somos nós que fazemos o chão,
somos nós que saímos de lá.

Dedicados ao máximo, sim.
Mas o máximo pode ser pouco,
comparado ao que mais poderia. 

Por princípio, o princípio do fim
de esperar vai ficar quase louco
se o que espera é uma simples magia.

03.05.2011

segunda-feira, 2 de maio de 2011

ALTURA - Rogério Camargo (Tela de Marcia)

(Tela de Marcia Bührer - A Cor Trazendo Música. Oleo sobre tela 80x70. Acompanhe o trabalho da artista em Olhos Pincelados)

Não se pode destruir uma idéia.
Quando ela morre, é porque foi deixada
como uma pedra que ficou parada,
como um teatro sem qualquer platéia.

Se permanece e vive reforçada
é porque entramos nós em sua teia,
batendo nas paredes da cadeia
com rejeição por ela ignorada.

A arma verdadeira e eficaz
é uma aceitação total, serena,
que não se importa com o que ela faz.

Parece desistência mas não é:
pelo contrário, a vida mais pequena
recebe altura, porque fica em pé.

29.04.2011
ROGÉRIO CAMARGO

ESCOLHA IMPOSIÇÃO - Rogério Camargo (Tela Marcia)

(Tela de Marcia Bührer - Brincadeira de Rua. Oleo sobre tela 40x50. Acompanhe o trabalho da artista em Olhos Pincelados)

A vida não precisa ser bonita.
Sequer precisa ser a vida boa.
Mesmo sendo a forma feia, esquisita,
importa é o que se faz como pessoa.

A rejeição, porque é uma tola, grita
onde a revolta quase sempre ecoa.
E o medo, esse terrível parasita,
faz o comércio dele, não destoa.

A escolha passa a ser imposição
de quem aceita apenas o aceitável
criado pelas tintas da ilusão.

A vida é tudo de vivenciável
e quem se esconde atrás da condição
não passa, fica preso ao detestável.

29.04.2011

DESEJO - Rogério Camargo

(Tela de Marcia Bührer - Nomade I. Oleo sobre tela 40x50. Acompanhe o trabalho da artista em Olhos Pincelados)

Tu desejas aprender a poetar.
Consideras tão linda a poesia
que almejas para ti um bom lugar
entre os que escrevem o que escreverias. 

Perguntas: O que faço pra chegar
a este objetivo que angustia,
que tira o sono e faz imaginar
que é impossível ter esta alegria? 

Apenas a vontade de ter feito
jamais substitui a criação,
estar fazendo, mesmo com defeito.

Quanto ao destino dado ao que se fez,
se serve apenas para afirmação,
entra na fila, espera a sua vez.

01.05.2011
ROGÉRIO CAMARGO

MASCARADAS - Rogério Camargo

A Consciência pode ser comprada?
Quem assim pensa tão somente adia
a hora de enfrentar-se, destinada
a se fazer, mais dia, menos dia. 

Truques bem feitos, bela mascarada,
até parece que a dor esvazia,
que o rejeitável tem outra morada,
que não existe mais o que existia. 



Uma mentira muito repetida
até parece que virou verdade
para quem quer fugir da própria vida. 

Parecer não é ser. Realidade
que se confirma forte e destemida
quando o infantil ganha maturidade.
01.05.2011

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