Era exótica aquela figura. Por várias vezes havia dado
entrevista para a televisão. Era uma celebridade no folclore local: Um Profeta
de Rua. Desde sempre estivera na cidade, no coreto da pracinha, a sua
moradia. Vestia as roupas que lhe deixavam, a comida que preparavam e, em
troca, lhes dava a voz das Altas Esferas.
Qualquer um que se aproximasse poderia ser agraciado com
uma profecia, meio presságio, meio enigma, recitada em repente de cordel e
deixada no ar para que cada qual a interpretasse por si só. Logo se calava
dançando ao som da música que, das esferas vindo, só ele ouvia.
O repórter lhe perguntara, certa vez, que esferas eram
essas. Ao que ele lhe respondera sério com o dedo em riste apontado para o céu:
— Ouvir estrelas? De certo me dirás que perdi o senso, e te
direi no entanto; não só poeira delas recebes e, nem esta, tu percebes. Quem é
o néscio, portanto?
Quis o destino que um dia o governador do estado, em plena
campanha pela reeleição, por ali passasse e desgostasse da figura folclórica. Mandou
seus assessores removerem o “lixo” da praça do coreto, pois ali pretendia
discursar. E o que parecia caso fácil para tão nobres senhores se tornou algo
complicado, frente à ação popular.
Os primeiros a comprar a briga na defesa do profeta das
estrelas esféricas, foram os moleques que, com suas atiradeiras, deitaram
pedras nos capangas de terno, pagando com isso velha dívida adquirida com o
mestre, nas dicas dadas à moda de cordel sobre matéria de prova por fazer.
Veio a polícia, relutante, para ajudar a restabelecer a
ordem pública. O governador haveria de desculpar, homens bravos e fieis no
cumprimento do dever, podem enfrentar sem medo qualquer bandido foragido e
perigoso matador, mas não há nenhum homem neste mundo capaz de enfrentar a
própria mãe, esposa e sogra unidas em defesa do profeta cantador.
Quando a imprensa local se juntou ao tumulto, o governador,
político renomado que era, aproveitou para desfazer o engano. Anunciou que
ordenara aos assessores, demitidos sumariamente, apenas a remoção do lixo que
pudesse haver na praça, morada do distinto cidadão, a quem viera consultar em
sua sabedoria sobre os desígnios reservados para a eleição.
O Ilustríssimo profeta não se fez de rogado, aceitou de
pronto o que lhe foi solicitado e, em particular, no coreto da praça,
encontrou-se com o governador. Antes tivesse sido decretado feriado, o povaréu
amontoado com olhos e ouvidos bem abertos, compareceu.
O profeta foi logo jogando na cara do governador, a sua
moda costumeira, seus desígnios que recebia em primeira mão do alto. Aquele
homem, que o povo anteriormente escolhera em boa fé, e que novamente ao povo
recorria, haveria de receber o prêmio que merecia se no dia do pleito em
questão, viesse até o coreto, antes que o dia clareasse completamente, e
acendesse uma vela no lugar marcado, em prece ao Santo Padroeiro da Cidade.
Ainda havia mais um pedido a fazer, este escrito em papel para somente os olhos
do governador ver.
Ao ler o dito cujo, o governador empalideceu e abriu a
boca, mas o profeta já estava a anunciar ao povo que, cumpridas todas as
exigências feitas, naquele mesmo lugar, haveria de cair uma rica chuva que
traria fortuna a todos na cidade, mas que apenas quando a poeira das estrelas
abaixasse é que poderiam tocar no que caíra.
Cada qual interpretou a sua maneira o tal desígnio, todos
cientes que tudo dependia apenas do governador para a tal riqueza surgisse. Este,
encurralado entre o papel que exigia vultosa soma a ser entregue com instruções
detalhadas no dia do pleito, ou a perda dos votos certos de todos ali
presentes, decidiu que haveria de embarcar nessa encenação para depois dar cabo
do canastrão.
No dia marcado, logo ao nascer do sol, quando as últimas
estrelas ainda podiam ser vistas, lá se foi o governador, com os volumes
arrumados, para o local combinado. Tão logo chegou no coreto, encontrou vela e
fósforo prontos para homenagear o Santo Padroeiro Protetor das Virtudes
Simples.
Tão logo o fósforo foi riscado, a explosão se fez,
sacudindo todas as casas das redondezas. Do coreto tão somente pedaços miúdos,
que caíram antes mesmo que a poeira baixasse, mas qual não foi a surpresa de
todos que acudiram ao lugar, ao ver a chuva de dinheiro que descia lentamente.
Analisada a causa da explosão, ficou-se sabendo que sob as
propriedades havia um imenso bolsão de gás natural que escapara por uma fissura
na terra se acumulando sob o piso do coreto. Do pobre governador só sobraram os
benditos pedaços em meio ao concreto.
Venceu a eleição, postumamente, mas não pode levar o cargo
para onde foi mandado. Do curioso profeta, não se teve mais notícias, uns dizem
que o vento levou sua voz como leva poeira para longe, para onde outros
necessitados aguardavam. No íntimo, muitos acreditam que nas estrelas fez sua
morada e juram de pés juntos, portanto, que quando chamado em prece de noite,
na lua cheia, altas esferas respondem, piscando.
4 comentários:
é meu amigo tais esferas são frequentadas por figuras inusitadas, mas o teu blog é com certeza maneiro pacas, vai lá no meu e pega o selo, abç!
Danny estou amando ler tudo o que vc escreves.
Ainda não sei o que fazer para postar seguidores.
Queria ver minha carinha no seu blog. Como se faz?
Obrigado pelo prestígio Zisco, prêmio recebido.
Rachel,
Obrigado menina, sabe que a sua opinião é muito importante.
Você e todos os interessandos em tornarem-se seguidores podem procurar na lateral do blog a coluna de seguidores. Acima dos seguidores tem o link "tornar-se seguidor deste blog", basta clicar nele e fazer a sua inscrição.
Fico honrado pela presença, vocês são a razão deste blog existir e me deixa satisfeito saber que estou atingindo o objetivo de levar informação, arte e entretenimento a todos.
Obrigado
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