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Segundo
uma antiga lenda que agora vou contar, existiu em algum lugar, uma cidade
cercada por um muro altíssimo que não poderia ser escalado e nem derrubado.
Ninguém sabia quem havia construído o muro ou qual o motivo dele estar lá, mas
como conviviam com ele desde que nasciam ninguém se importava.
Ou
melhor, quase ninguém, porque entre eles nasceu um dia O Incorformado.
O
Inconformado era uma pessoa comum, passou sua infância e sua juventude
convivendo com o muro, sorria e brincava, trabalhava e pagava suas contas,
sofria por amor e tinha lá seus gostos e opiniões como todos. Mas havia uma
coisa que o tornava diferente: Não aceitava o Muro que o limitava.
Tudo ia
bem, até que um dia o Inconformado decidiu dar um basta na situação: Iria
vencer o Muro.
Armou-se
de todas as ferramentas necessárias para vencer a barreira e lá foi ele com
toda a coragem de que dispunha.
Primeiro
tentou escalar o muro, mas provou apenas que isso era mais difícil do que
parecia. Resolveu golpea-lo e abrir um buraco nele, mas o muro parecia ser
feito de diamante de tão duro. Pouco a pouco suas tentativas foram se
frustrando.
Como
não podia deixar de ser o boato correu pela cidade e todos foram ver o “Louco
do Muro” que dizia iria atravessa-lo custasse o que custasse.
E a
multidão delirava a cada fracasso do Inconformado. Alguns o incentivavam a
continuar até a morte, e que esta sobreviesse rápido. Outros sorriam balançando
a cabeça diante de tamanha estupidez. Moleques mais perversos lhe atiravam
pedras e insultos. Mas o Inconformado não desistia.
Não
podia mais suportar a ideia de ter que conviver com o muro.
Pouco a
pouco as pessoas da cidade foram perdendo o interesse e voltando às suas vidas
normais, cercadas pelo Muro.
O
Inconformado ficando cada vez mais triste e sozinho.
Um dia
percebeu que restava apenas um estranho ao lado dele.
Não o
conhecia, o que era impossível. Sendo o Muro intransponível como poderia aquele
ter vindo de outro lugar que não a cidade onde todos se conheciam?
—
Interessante como quando estamos tão próximos de um problema não conseguimos
ver a solução — disse o Estranho.
— De
onde é você?
O
Estranho apenas sorriu e foi andando para longe do muro e o Inconformado o
seguiu, curioso.
—
Barreiras foram criadas para nos proteger enquanto não estamos aptos para vencê-las
— disse o outro sem ver se o Inconformado o acompanhava — mas elas podem
se tornar uma prisão quando nos conformamos em ficar presos dentro delas. As
mesmas paredes que o guardam, também podem prende-lo. A menos que você as
compreenda e as use corretamente.
— E
como farei isso?
—
Observe...
Tinham
se afastado suficientemente do muro para vê-lo quase por completo e o Inconformado,
pela primeira vez, notou que havia uma irregularidade. Uma parte do muro
parecia se diferenciar do resto, a poucos passos do local onde havia protagonizado
suas frustradas tentativas de escapar.
— Seu
instinto o conduziu até um caminho possível, confie nele, mas apenas a sua
razão pode compreender um problema e soluciona-lo, confie nela também. Usando
os dois vai aprender sobre o funcionamento do problema e aprender como usar os
caminhos que descobrir.
De
volta ao Muro o Inconformado empurrou a parte que se diferenciava ao longe e
esta gentilmente cedeu mostrando uma porta por onde se via uma linda planície.
Ele estava livre.
—
Sempre soube que havia uma saída! Ah, quantos me chamaram de louco, mas aqui
está. Vou esfregar essa porta na cara deles....
— E a
perderá para sempre. O que ganha ao mostrar a porta para pessoas que não estão
preparadas para atravessa-la? Por que tirar a segurança daqueles que possuem apenas
isso, sem nada dar em troca? Quando estiverem preparados para ir além, encontrarão
a saída para longe de sua antiga proteção e poderão trilhar a próxima etapa. Somente
então deverão fazê-lo. É assim que se tornam mais fortes, vencendo os limites
quando estão preparados. Usando seus limites para ficarem confortavelmente
seguros enquanto se preparam para os desafios que virão.
— Quem
é você? De onde Veio?
— Vim
de um lugar onde havia limites que superei. Não resisti em oferecer ajuda a um
irmão de caminhada. Podemos andar por um tempo juntos mas logo nossos caminhos
se afastarão e cada qual irá buscar o novo limite e tentar supera-lo, Talvez
nos encontremos de vez em quando, mas quando o fizermos poderemos nos
reconhecer, trocar informações e confiar um no outro.
E
dizendo isso o estranho atravessou a porta e foi embora.
O
Inconformado soube então que tinha que tomar uma decisão difícil. Fechar a
porta e permanecer em território conhecido e seguro? Ir além e arriscar-se ao
desconhecido enfrentando o próximo obstáculo? Ficar e tentar ajudar os outros a
superar os seus próprios limites e tornar-se um guia na busca pela porta? Em
cada decisão um rumo diferente, um desafio a ser enfrentado, um novo Muro.
Compreendeu
finalmente que os Muros eram construídos dentro de cada um e que serviam sempre
para proteger ou aprisionar, conforme fossem usados.
Com um
sorriso tomou a sua decisão. Sentia-se livre para ser feliz e encontrar com
alegria o próximo obstáculo que lhe indicaria uma nova fase de crescimento.
E assim
o fez...
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