Tem aqueles dias que você precisa de uma opinião, mas não
encontra. Aconteceu comigo dia desses, o jeito foi tentar ir lá na esquina para
ver se encontrava alguma que se ajustasse ao que precisava.
Na esquina sempre tem alguém com opinião, é uma lei quase
que universal isso. Antigamente era nos cantos que ficavam as opiniões, lembra?
Aquela professora centenária que já olhava por cima dos óculos com ar de toda a
sabedoria dos campos de batalha e declarava: Pegue a sua opinião e vá lá para o
canto pensar no que está fazendo. E acrescentava implacável: E de costas para
os outros que ninguém está interessado na sua opinião.
Tempo bom, aquele. Hoje não se faz mais isso, dizem que
traumatiza, que bobagem. A verdade é que agora as opiniões vêm de longe. Da
China ou da Índia, onde se fabricam opiniões aos montes para distribuir para o
resto do mundo por um preço bem abaixo do que as que são produzidas “in Loco”.
Opinião viajada, para todos os tipos e gostos. Dizem que
por lá não fica quase nenhuma, mandam todas para fora, para manter o controle,
de qualidade. Enfim, o importante é que sempre que se precisa de opinião,
pode-se recorrer à esquina que lá tem. Eu precisava muito de uma.
Cheguei lá o cara já foi logo tentando me empurrar uma opinião
pronta, como se eu fosse algum otário que aceita as coisas assim facilmente.
Comigo não! Vou logo apontando o problema. “Essa roupa vermelha? Que é isso? Está
tirando uma com a minha cara? ”. Logo
fica todo condescendente, percebe que sou dos que tem cacife para coisa mais
alta. “Desculpe, Senhor. Prefere azul? Não? Já sei, o senhor tem jeito de quem
gosta de um verde com alguns detalhes em amarelo. Acertei? Pois é, está muito
na moda agora. O senhor tem bom gosto. Ora se tem. ”.
Tira a roupa vermelha e pega outra verde e amarela no saco
em que tinha todo tipo de cores. Quem seria a coisa que pegaria aquele rosa
choque com purpurina? Algum artista? Droga, quase deixo escapar o detalhe.
“Essa esquerda está com defeito. Não vou querer levar isso não”. “Nossa, não é
mesmo? O senhor tem bom olho, percebeu logo de cara. Espera que vou trocar.
Prefere duas direitas? Não? É, acho melhor não, acabam brigando entre si.
Espere que vou dar um jeito. Já sei o que o senhor precisa, um minutinho. ”.
Reforma daqui e reforma dali até que a opinião ganha ares mais equilibrados.
Fica melhor assim. Qualquer coisa a roupa disfarça alguma imperfeição que possa
ter escapado por baixo dos panos.
Olho o relógio preocupado, o tempo passa e nada da opinião
estar pronta. Daqui a pouco nem adianta mais. Dou uma olhada no trabalho que
ele está fazendo e vejo que já tem alguma articulação. Isso é bom, todos gostam
de uma opinião bem articulada. Dá para você levar ela para um lado ou para o
outro, de acordo com o momento, fazer parecer diferente só mexendo um
pouquinho.
Ele dá uma escovada bem forte para tirar uma poeira imaginária,
passa um produto nas superfícies expostas para dar uma lustrada e o conjunto
todo fica maravilhoso, aspecto novo. Estou impressionado com a habilidade, vou
recomendar para os amigos quando precisarem de opiniões. Guardo um anuncio na
manga sem que ele perceba. É importante ter sempre um cartão na manga quando se
lida com fabricantes de opinião.
Já ia embalar para me dar, mas peço que espere. Vou conferir
melhor. Há coisas que só se veem quando estão na nossa mão. Dito e feito, logo
percebi o engodo. “O que é isso meu amigo? Está vendo aqui? Made in China! Está
de brincadeira comigo? Estou pagando caro pela opinião e o senhor me vem com um
produto de segunda? ”.
Peguei-o de jeito. Comigo é assim, não dou mole com as
opiniões. Se é para ter uma, que seja o melhor que se pode ter. Percebe que não
vou aceitar ser enganado, nem tenta. Emputecido pega a opinião e arranca o selo
deixando de lado, vai acabar passando para algum outro trouxa, tenho certeza.
De baixo do balcão pega uma caixa fechada à chave. Abre e tira de lá outro
selo, sem deixar ver o que mais tinha, uma arma creio eu, não me intimido. Me
mostra antes de aplicar para que veja: Made in USA. Agora sim. Aplica o selo de
qualidade na opinião e finalmente embrulha.
Coloca na sacola uns confetes, de brinde pelo
constrangimento. Pega o dinheiro que desaparece rapidinho. Quando vê que estou
satisfeito com a minha opinião elogia: “O senhor é um grande formador de
opinião! ”. Dou risada e confirmo, já está fazendo efeito. Não há nada melhor
do que ser reconhecido pelo que se tem.
Opinião
é tudo, hoje em dia!
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