O
valentão entrou no barzinho com cara de nenhum amigo, seguido de perto pelo seu grupo, que servia de inspiração e segurança para as provocações que gostava
de fazer.
Foi
logo sentando-se em um canto privilegiado onde pudesse buscar a sua vítima. Tão
logo a encontrou, fez como se não a tivesse visto preparando o teatro que lhe
era característico e em ar professoral disse para os seus discípulos.
—
Um homem tem que ter atitude, ser macho. Não pode se curvar diante de nada,
porque a vida foi feita para os fortes, e quem não gostar disso, que dê o fora
dela.
Os
asseclas assentiram como lhes era devido fazer
e ele continuou inspirado.
—
Essa coisa do cara usar terno, ficar todo perfumado, alinhadinho. Isso é coisa
de gay, de gente que não presta. É só ver esses políticos, tudo de terno. Bando
de pilantra isso sim. Queria ver se eles tivessem que trabalhar, usar os músculos
— e batia no bíceps desenvolvido em academia e na farmácia — mostrar que são
homens mesmo. Que nada. Sairiam todos como se fossem umas galinhas assustadas.
E
fez a sua demonstração caricata de uma galinha assustada para divertir os que o
adoravam como exemplo mor da masculinidade.
—
Mulher gosta é de cara macho, não desses engomadinhos. É ou não é?
E
o seu grupinho concordou animado.
Feito
o teatro preparatório, levantou-se como se tivesse descoberto naquele momento o
cara de terno, cabisbaixo na mesa logo a frente, o copo cheio de um líquido
indefinido.
Traçando
uma linha reta entre predador e presa, foi logo dando o bote na vítima
desavisada. Puxou a cadeira e sentou-se
de frente para o homem, esperando que o mesmo reclamasse da atitude. Estufou
ainda mais o peito para parecer mais musculoso e intimidador.
Mas
o homem não deu ar de que o havia notado, com o olhar pregado no copo.
Indignado
com a atitude indiferente do outro o valentão pegou o copo sobre a mesa e de um
gole o esvaziou batendo o copo vazio no tampo enquanto berrava para que todos
ouvissem.
—
E agora? O que você vai dizer sobre isso?
O
outro olhou para o homem que estava na sua frente e começou a falar calmamente.
— Dia ruim. Sabe, hoje acordei atrasado para uma entrevista importante, o
relógio quebrou e não despertou. Saí correndo e acabei batendo o carro. Larguei
lá mesmo onde estava, não podia perder tempo. Penei para conseguir um táxi e o
motorista se perdeu e nos enfiou em um congestionamento. Paguei o táxi e fui
andando, mas vieram uns caras e me assaltaram. Cheguei no trabalho e o patrão
me demitiu porque não compareci na reunião com os investidores e perdemos o
negócio. Voltei para casa andando porque ninguém tinha um centavo para me emprestar.
Chego em casa e encontro a minha mulher com outro cara na minha cama. Pego uma
arma para matar os dois, mas a arma estava velha, não funcionou. Saí de casa
disposto a acabar com a vida. Entro no primeiro bar e vem
um desgraçado e bebe todo o veneno do meu copo. Só pode ser um dia ruim. Quer
saber? Pra mim chega!! Amanhã vou reaver o meu emprego, fazer as pazes com a minha mulher e
arrumar o carro. Não posso ficar deixando que os outros decidam a vida por mim.
E
o homem de terno levantou-se e saiu do bar deixando os seus
problemas para trás. Felizmente não é sempre que se tem um dia ruim.
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