Esta
é uma crônica de ficção desenvolvida na fantasia paranoide e esquizofrênica de
alguém que, provavelmente, você não conhece, mas já deve ter ouvido falar.
O
relato se passa ao longo de alguns anos, embora tenha sido classificada como
uma crônica e, portanto, devesse ser uma espécie de fotografia de um momento.
Isso deve-se ao fato de que, na impossibilidade de se entender a profundidade
imediata, necessita-se do recurso da montagem de instantes progressivos,
formando um mural que vai evoluindo e se tornando mais claro nessa progressão
que está dada de forma estática. Um filme de um diapositivo apenas, por assim
dizer, semelhante àqueles infográficos que revelam uma evolução de eventos
analisados.
Se
fosse possível alinhar a pré-história desta crônica, ela se perderia em eventos
difusos e confusos, distorcidos muitas vezes e reafirmados de tantas maneiras
que o melhor a fazer é simplesmente saltar para um recorte um pouco mais
imediato, sabendo-se apenas que o que possibilitou este, foi todo um processo
que se estende por décadas, séculos, talvez milênios anteriores.
Por
ser uma fantasia deveria começar com “Era uma vez” no padrão clássico, e alguns
analistas até iriam sorrir e dizer que essa sentença deveria vir ao final e não
no início, e, talvez, estejam certos. Mas vamos fazer um pouco diferente, vamos
imaginar um instante qualquer e destruir a cronologia mais específica, apenas
alinhavar alguns elementos em forma de cenário e deixar que a composição
artística faça o seu papel de estimular o pensamento e o sentimento, sem impor
uma determinada interpretação ou (não encontrando palavra melhor usaremos esta)
julgamento.
Houve
um tempo em que havia um pais controlado de forma inflexível por forças que,
por sua natureza, eram fortes. E como todos sabem, desde que Newton declarou
para o mundo, toda força gera uma reação contrária de igual intensidade. Então,
por um desequilíbrio qualquer do instante, ou por uma corrupção (e este é o
termo que define a perda da integridade de qualquer coisa) da força que a
sustentava, a reação assumiu o papel de principal evocadora de eventos.
Espere,
não desista, vamos tentar simplificar com metáforas este tortuoso raciocínio.
Digamos que haviam soldadinhos de chumbo controlando o castelo dos sonhos, mas
por algum motivo que não vem ao caso no momento, mudou-se o controle para peças
escolhidas e aclamadas, dentre as que compunham todo o entorno social daquele
território que se vai denominar de país. Necessário dizer que estas peças
aclamadas eram, basicamente, as envolvidas na manutenção, orquestração ou
oposição a situação anterior. Ou seja, havia um equilíbrio tenso anterior e devido
as mudanças que ocorreram pelo declínio das forças que o mantinham, formou-se
com essas forças expoentes um novo equilíbrio que se supunha menos tenso.
Diriam
os mais entendidos que quando há um confronto de forças opostas sempre se dá um
tipo de equilíbrio tenso, até que algo o desestabilize, mas não vamos seguir
essa linha por enquanto. Digamos que, nessa nova realidade, os que não
apareciam diretamente passaram a ter a possibilidade de falar e agir.
De
certa forma, essa liberdade de ação acompanhou o advento da internet que ganhou
flexibilidade e expandiu-se para além do que seria possível ser imaginado.
Claro que, como tantas outras forças ocultas ou não, esta também passou a ser
estudada e utilizada de forma mais ou menos eficiente pelos que gostam de
controlar mecanismos e obter destes algum proveito. Novamente interrompemos
esta linha apenas para evitar que as ramificações se tornem extensas demais,
apenas deixamos mais essa sombra difusa para compor parte do crepúsculo do
cenário.
Não
se pode agradar a todos, isso é fato antigo e com diversos estudos acerca, mas
o que se costuma chamar de democracia tenta fazer com que a suposta maioria se
sinta satisfeita com a média dos resultados obtidos. Poderíamos dizer que por “democracia”
se entende uma variedade grande de sistemas políticos que buscam suas forças na
representatividade da, assim denominada, maioria votante. E por “maioria
votante”, poderíamos supor se tratar daqueles que expressam os seus interesses
diretos ou indiretos através do uso e convencimento do uso dos votos de
representação. Outra linha que fica sem uma conclusão apenas por necessidade.
“Mas
quantas linhas soltas nessa sua crônica! ” Diriam os críticos de plantão (e
sempre os há), ao que responderíamos: Sim, em todas as narrativas que tentam se
basear em verdades, existem linhas soltas que podem ou não ser seguidas na
tentativa ou não de se ampliar a verdade que demonstram. Normalmente não o são,
então não fugiremos ao padrão também. Respondidos aos críticos, voltamos ao
nosso relato.
Alguns
personagens necessitam aparecer para que se justifique o título. Vamos então
colocar alguns que podem indicar alguma coisa. Colocamos um delfin, da família
dos cetáceos, é um mamífero muito hábil e inteligente, capaz de coisas
insuspeitas. Poucos sabem que na mesma família encontra-se a Orca, erroneamente
chamada de baleia, assassina.
Temos
também alguns pássaros chamados de tucanos, que possuem um bico enorme, oco e
frágil. Pelo tamanho do bico poder-se-ia supor força, mas aparências enganam, e
nos tucanos as aparências possuem cores fortes e bonitas de se ver.
Tem
um outro personagem importante, da família obscura dos calamares, a lula. Esta
costuma ser pequena de apenas sessenta centímetros, mas alguns conseguem evitar
os predadores e crescer até o tamanho descomunal de quatorze metros. O que não
conseguem mudar é o fato de que sempre terão os pés na cabeça, por isso
chamados de cefalópodes.
“Mas
isso está parecendo um zoológico, não um circo” reclamam novamente os
detratores da liberdade poética. Respondemos: há circos de diversas formas,
alguns marinhos, outro de pulgas. Mas para que não digam que não fizemos caso
das críticas, vamos acrescentar um palhaço, desses que se fantasiam com roupas
coloridas, tem colarinho folgado e uma tremenda cara de pau, pintada com cores
fortes. Satisfeitos? Ok, agora já temos os personagens, mas cadê o circo?
Então,
essa é a parte difícil desta crônica, podemos apresentar o local, podemos
apresentar alguns personagens (outros não vão aparecer porque não querem, não
foram descobertos ou simplesmente se esconderam mesmo depois de revelados), mas
não conseguiremos definir exatamente onde ou como se dará o circo, cuja lona
ainda está sendo montada. Sim, alguns circos costumam ter uma lona por cima ou
por baixo, e alguns acabam até beijando a lona no processo, uma forma de
reverência, por certo.
Como
todo circo que se preze, este também é revestido de uma certa magia, muita
enrolação e manipulação dos humores, muito ilusionismo (você vê, agora não vê
mais), e necessariamente um apresentador que vai se dirigir ao público
utilizando o termo “Respeitável”.
A
parte engraçada é que nenhuma das partes, seja as que compõem o circo, seja as
que prestigiam o espetáculo, se preocupa com a questão primordial do que seria
o tal “respeitável”. Sabemos que algo imponente, forte ou temerário é, por sua
própria natureza, “respeitável”, como diz o velho adágio: Manda quem pode,
obedece quem tem juízo.
E
assim temos o espetáculo e o nosso diapositivo montado rusticamente. Nele
podemos ver as forças anteriores, a evolução do cenário, o palhaço que não falta,
e não faz falta, e vira herói das ingênuas crianças. O imenso calamar que luta pela
sobrevivência atacado por pássaros carnívoros e que, por ser cefalópode, ou
corre, ou pensa, ou nada.
Temos
também os animadores de torcida, os ilusionistas, os vendedores de pipoca estrategicamente
posicionados que aplicam sal até nos doces para aumentar a sede e vender mais. E
não esqueçamos dos trapezistas, dos malabaristas, dos equilibristas com suas
bicicletas. Dos paquidérmicos que se movem com custo e lentidão indolente,
apesar de sua enorme força e, é claro, do respeitável público para quem todo o
espetáculo foi montado e que, na maioria das vezes, gostaria de estar em outro
lugar, mas ficaria feio dizer que não participou de um evento tão dramático.
“Pura
enrolação! Cadê o final? Onde está a sequência de fatos prometidos para compor
a crônica e justificar tudo isso? ” Pedimos calma e dizemos que já estão dados
os principais pontos, é o máximo que podemos relatar em tão curto espaço, já estendido
por demais.
“Fomos
enganados!!!” Dirão aqueles mesmos, acrescidos de alguns mais. E temos que
dizer que concordamos, de certa forma. Aliás, justifica-se aqui o uso do tempo
verbal no plural quando nos referimos ao narrador. Verdadeiramente fomos todos
enganados, só que alguns ainda estão decidindo acerca de como, por quê e desde
quando. E nem vou falar no que ainda virá, que promete ser um grandioso
espetáculo, mas isso fica para a próxima fantasiosa crônica, se é que será possível
construí-la.
Afinal,
não há nada mais temerário em um circo do que o cair do pano.
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