É um fato científico que a humanidade deve sua
existência a extinção em massa que acometeu a Terra há 65 milhões de anos.
Praticamente todas as formas de vida foram exterminadas nos eventos que
ocorreram, e que até hoje não foram completamente explicados. Normalmente atribui-se
o início da extinção a um cometa ou meteoro gigante que colidiu com a Terra na península
de Yucatan, no México, e que teria desencadeado uma série de eventos
catastróficos que culminaram com o reinado dos grandes répteis.
Ironicamente se isso não houvesse ocorrido talvez os
mamíferos jamais tivessem conseguido evoluir até a sua mais impactante forma:
os humanos.
A ciência, construção dos humanos, tem se dedicado a
buscar respostas no passado para prever e modelar o futuro, de forma que a
espécie humana possa sentir-se segura.
A ironia também é uma das ferramentas mais importantes
em uma forma de ciência desenvolvida pela humanidade: a literatura. A
literatura se apoia nos avanços tecnológicos para produzir e transmitir suas
obras, que nada mais são do que histórias reais ou extrapolações destas em uma
infinidade de possibilidades conceituais, que muitas vezes acabam por inspirar
cientistas e, a partir daí, desenvolver novas tecnologias e novas histórias.
História, ciência, literatura, tecnologia e (por que
não dizer) ironia, são os elementos de uma história que está sendo produzida
agora.
Esta história começa com um avanço tecnológico que,
ironicamente, havia sido desenvolvido para uso militar, ou seja, na guerra de
humanos contra humanos, e que acaba sendo convertido em uma ferramenta que
pretende unificar as pessoas em todo o mundo.
Essa tecnologia chama-se internet e apoia-se em outra
tecnologia, a dos microprocessadores que dão corpo, a representação física, de
algo que ao longo de sua evolução vai se tornando cada vez mais intangível: A
Grande Nuvem de Dados, ou apenas “Nuvem”.
Inicialmente a “Nuvem” só era acessível a poucos, em
máquinas pesadas e caras, mas com o tempo as barreiras foram se desmontando e ela
foi crescendo em virtualidade e diminuindo em tamanho de representação física,
embora multiplicando-se exponencialmente na quantidade de suas representações.
A capacidade de adaptação é uma das principais necessidades
de um organismo vivo que deseje vencer as implacáveis leis da evolução: o
Darwinismo. De vírus a espécies gigantes, é necessário adaptar-se ao meio,
gerar descendentes férteis e eliminar os adversários. Para isso a natureza
oferece uma gama de possibilidades que vão da força bruta e resistência, ao
simples encanto sedutor.
Mas espere, estamos falando de humanos e suas
tecnologias. Os humanos têm sobrevivido a praticamente todas as catástrofes
naturais ou artificiais que tem surgido, ao ponto de que se começa a considerar
que o único adversário capaz de eliminar a humanidade seja a própria
humanidade. Para lidar com essa possibilidade é que existem os mitos, as
lendas, as histórias criadas a partir de elementos reais do presente ou do
passado, que se expandem aos limites do imaginável, em qualquer tempo, dimensão
ou lugar.
A mente humana alcançou o Multiverso primeiramente na
ficção, e posteriormente através da ciência, e se prepara para lançar nesse
infinito de universos através da “Nuvem”, um ser colaborativo, alimentado por trilhões
de humanos ao longo dos anos, doadores de seus conhecimentos, de dados
essenciais ou não, de possibilidades. Formuladores e beneficiários de códigos e
serviços fornecidos por essa entidade semicorpórea que parece pertencer exclusivamente
ao seu usuário, mas que existe antes e além dele (e possivelmente sobreviverá a
ele). Uma “maquina” que extrapola o conceito original de existência física e
que seduz, se multiplica e se reproduz pela necessidade cada vez maior de seus
parceiros: os usuários.
Milhares de mitos modernos alertam sobre a derrocada
humana pelo avanço absoluto das máquinas. Mas os humanos estão preparados para
evitar que essa entidade se torne “pensante”, embora não se saiba exatamente o
que seja isso?
Ironicamente os mitos também apontam para os alienígenas,
seres pensantes altamente tecnológicos e muitas vezes fazendo parte de
organismos coletivos – a semelhança de seres que habitam o nosso planeta, como
as formigas e abelhas – que tentam exterminar a raça humana sem um motivo, ou
lógica, aparente. Talvez apenas uma projeção da capacidade autodestrutiva da
humanidade. Com tantos planetas no universo, com tantos universos de
possibilidades, o que haveria na Terra que os interessasse? Humanos, talvez.
Muitos desses seres alienígenas, originários dos mitos
e medos da humanidade, vem para sugar nossas inteligências,
transformando os humanos em meros seres sem vontade ou intelecto, vorazes
criaturas em busca insaciável do que perderam; em outras palavras... Zumbis.
Os mitos evoluem junto com os medos, e quando as máquinas
não demonstraram a capacidade de aprender a partir do ambiente e de seus atos,
continuando a ser limitadas em seu “intelecto” a programas desenvolvidos por
humanos; e os alienígenas não apareceram em busca de cérebros (menos) inteligentes
que os deles (já que sequer saímos de nosso sistema solar, portanto
provavelmente jamais ficaram sabendo de nossa existência); então as histórias
começaram a voltar-se para um inimigo mais cruel, mais inteligente e ardiloso,
um assassino serial que habita o planeta há milênios: o próprio ser humano.
Os Zumbis passaram a ser criações deformadas de
tentativas de melhorar o próprio ser humano em sua matriz biológica, criando vírus
terríveis que infectariam os humanos tornando-os criaturas mais fortes e
destrutivas, quase imortais, porém sem capacidade intelectual, agindo por
instinto básico de buscar o que havia perdido: sua inteligência.
E na busca pela inteligência perdida, os Zumbis atacam
em busca de cérebros vivos, e só podem ser detidos quando o próprio cérebro
deles é destruído. Uma inteligência menor que tenta sugar uma inteligência
maior e, no processo, a destrói, ou pior, contamina-a tornando-a um vetor de
novas infecções.
Claro que os mitos são apenas criações fictícias,
invenções para assustar crianças e divertir adultos. É através dos mitos que
crianças aprendem que não devem mexer com fogo, devem temer estranhos, aprendem
sobre trabalho em equipe e que a recompensa só vem depois de muito esforço e
dedicação... Ou pelo menos era assim antes que o fenômeno Zumbi tivesse
infestado a humanidade...
Como assim? Fomos invadidos por alienígenas
disfarçados? Algum governo ou corporação privada criou uma arma biológica do
apocalipse Zumbi? Sim, porém não exatamente. Complicado? Nem tanto. Os mitos
nos alertaram.
A cada dia mais e mais pessoas sentem-se “conectadas”
a uma “Nuvem” que lhes diz o que vestir, o que falar, como agir; com quem e
quando; o que é importante ou não. Milhares de pessoas por minuto se “conectam”
para saber o que está acontecendo no mundo além, mas desconectam-se da sua
realidade imediata. Passam a viver na dependência do que fazem ou dizem pessoas que nunca vão
ver pessoalmente e que apenas julgam conhecer profundamente, mas só através do
que lhes foi dito (verdadeiro ou não) é que formulam esses julgamentos.
A “Nuvem” lhes diz. A “Nuvem” resolve seus problemas
emocionais, físico, intelectuais, suas crises psicológicas, suas dependências,
satisfaz seus desejos mais obscuros na virtualidade de um momento ilusório. E quando
desconectados de seu Deus Ex Machina, sentem-se desprotegidos, inúteis,
abandonados.
A medicina já criou a especialidade para tratar os
dependentes da “virtualidade”. Pessoas que tem a sua química cerebral alterada
pelo uso frequente das “treconologias” que os “conectam” com a realidade
distante, e os desligam da própria.
Ironicamente, quanto mais conectados estão os
componentes físicos da “Nuvem”, menos conectados estão os seus usuários. Quanto
mais inteligentes se tornam esses artífices da Aldeia Global, menos inteligentes
se tornam os cidadãos aos quais supostamente servem.
Governos e Corporações privadas criaram o “vírus Zumbi”
que ataca todas as pessoas, de todas as idades, sugando suas mentes, sugando
suas memórias, sugando suas vidas e energias, tornando-as autômatos que pensam
estar vivos, mas estão apenas conectados em uma “Nuvem”, vivendo vidas que não
são reais, julgando-se mais inteligentes ao sugar de outros as produções
intelectuais que simplesmente duplicam como suas.
Os mitos alertaram-nos, a guerra das máquinas já está
acontecendo, os Zumbis (humanos bestificados pela "treconologia") estão ai ao seu
lado e provavelmente vão sugar sua mente. Os invasores de corpos já estão entre
nós, aparentemente humanos normais, mas sem capacidade intelectual para salvar
a sua vida se precisar de um médico (mesmo que tenham diploma dizendo que o
são), ou evitar que a sua casa ou a ponte onde transita caia (ainda que tenham
documentos dizendo que são engenheiros), só para citar alguns casos comprovados.
Ironicamente, no andar da carruagem, não teremos que
nos preocupar com a superpopulação, com as guerras declaradas, com a fome e a
falta de recursos. A natureza já cuidou para que as leis Darwinistas da
Evolução sejam aplicadas pelo mais eficiente artífice das catástrofes, o
próprio ser humano. Morreremos às centenas, aos milhares, assistiremos
horrorizados pela “Nuvem” o desastre da humanidade, e logo a seguir iremos
comentar em alguma rede social, com o nosso amigo virtual, sobre a tragédia que
aconteceu, enquanto nos sentimos seguros, bem distantes da influência maléfica
e deformadora dos mitos e da imaginação literária.
E
quem sabe daqui a algumas centenas ou milhões de anos, a próxima espécie
inteligente deste planeta tente descobrir como uma simples pedra (Silício) pôde
exterminar toda uma espécie dominante e poderosa. Mas isso, já será outro Mito.
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