segunda-feira, 28 de novembro de 2011
PÉ MAIOR - Lariel Frota
-Que nada vô, to atrapalhadão por causa das aulas de catecismo.
-Não acredito! Tira nove de matemática, nove e meio de
português e se atrapalha com o catecismo?
-É vô, esse negócio de pecado mortal, pecado venial,
pecado capital. A catequista mandou fazer uma pesquisa pra esclarecer as
dúvidas, ficou mais confuso ainda.
-Posso saber porque?
-Na última aula ela
perguntou se alguém sabia o que era pecado capital. Eu, todo
sabidão levantei a mão e paguei o maior mico.
-Como assim?
-Eu pensei: se é
pecado capital,só pode ser aquele que acontece numa capital. Se estou em São Paulo, esse pecado só pode
acontecer na cidade de São Paulo que é a
capital do estado, se for em Campinas, São Carlos, Araraquara não é pecado
capital é de outro tipo.
-E o que aconteceu quando você deu essa explicação?
-Ora, todo mundo caiu na risada, até o Pedrinho que é
meu amigo deu uma risadinha sacana meio disfarçada, igual essa que você tá tentando disfarçar!

-Sei lá!
-Porque
pecado traz sofrimento,é falta de amor a Deus e ao próximo.
-E quem
escolhe o que é pecado e o que não é?
-Bem, no
caso dos pecados capitais.....
-Que são
sete....isso descobri na minha pesquisa:vaidade, inveja,ira, preguiça, avareza,
gula, luxúria.
-Pois
então: a igreja católica criou essa lista de pecados que devemos
evitar.
-Quer
dizer que não foi DEUS quem organizou a lista?
-Não
Claudinho. Com intenções de controlar, educar, proteger, a igreja determinou o que seria pecado.
-Agora
enrolou de vez.A mamãe falou outro dia
que preciso aprender a cuidar da
aparência, lavar direito o cabelo, escovar os dentes, escolher camiseta da hora
quando for passear no shooping, usar a colônia que a vovó me deu: isso não é
vaidade?

Isso sem
falar da economia que você me ensinou a fazer guardando cada moedinha que não
gasto a toa, no meu cofrinho do pirata, não parece avareza deixar
de tomar duas bolas de sorvete pra guardar dinheiro? Ah, tem também aquela
coisa de ter uma vontade bem grande de comer dois pedaços do
bolo de chocolate que a vovó faz de vez em quando, será pecado nunca conseguir comer só um pedaço. Quer
saber, só de falar nele agora me encheu a boca
de água!!!!
-Olá
rapazes. Posso interromper a conversa animada?Ouvi você falar em bolo de
chocolate Claudinho, parece que adivinhei.Que tal uma caneca de café com leite
e uma boa fatia do tal bolo heim???
(...)
-Diz aí
Cláudio Augusto, conseguiu esclarecer
suas dúvidas sobre pecado capital? Aquele dia a gente nem terminou o papo sobre
o assunto.
-Pois é
vô.Fui pesquisar na internet.Acho que descobri uma coisa interessante.
-É mesmo?
-Quer
ouvir?Cada um desses pecados tem um diabo que toma conta deles, eu até imprimi
pra te mostrar,leia em voz alta.
-Vamos
lá: Vaidade – Lucifer; Inveja – Leviatá; Ira – Azazel; Preguiça –Belphegor;
Avareza – Mammon; Gula – Belzebu; Luxúria- Asmodeus!
-Viu só,
matei a charada: A gente precisa se cuidar, tratar do cabelo, da pele, dos
dentes, estar sempre bonito. Agora se exagerar na frente do espelho esquecendo
outras coisas importantes, o que era uma coisa boa pra gente,vira pecado e o
tal do Lucifer fica bem feliz.
-Ora
vejam só que grande conclusão.

-Aí é
pecado e burrice, pois vai perder tempo
e os dois farão uma prova ruim.
-E os
dois tiram nota baixa!
-Então
esclareceu tudo?
-Mais ou menos, quando chegou na luxúria precisei
pedir ajuda ao papai, o troço é meio confuso né?
-E você
ficou satisfeito com a explicação do seu pai?
-Claro
vô. Ele me levou até o carro dele, me deixou sentar no lugar do motorista e
mostrou que meus pés ainda não alcançam o pedal, também não consigo enxergar
direito,precisaria de uma bruta almofada pra enxergar e daí o pé ficaria
muuuuuuuuuuuuuito mais longe do pedal. Disse que um dia você fez isso com ele e isso ajudou a entender que tudo tem
um tempo certo pra entender e acontecer.
Que o pé dele era menor que o meu, e ele
era bem mais baixinho que eu na mesma idade. Daí fiquei tranquilão.
-Mesmo?

-Nada não
querido, foi só um cisco que caiu no meu olho,vamos que a vovó tá chamando pro
almoço!
segunda-feira, 21 de novembro de 2011
Bate, bate, bate, na porta do Céu - Danny Marks
As coisas não foram planejadas, sabe? Não era a minha intenção que acontecessem assim. Foi a sua? Ouvi dizer que sempre é feita a “Vossa Vontade”, não é?
Antes
fosse eu o único a duvidar disso, ou, sei lá, questionar.
Questionar
é o que me trouxe aqui, buscar respostas em alguém que tivesse respostas. Que
acreditasse por tempo suficiente, para me
responder.
O
cara lá na porta pensava que podia responder tudo. Tenho certeza que sim.
Eu conheci muitas
pessoas que acreditam, que são assim, que sabem todas as respostas. Ficam com um
ar altivo, de quem sabe tudo. Eu nunca soube de muita coisa, nunca consegui ter
um ar altivo. Orgulhoso sim, mas só isso. Pessoas como eu tem que se agarrar em
alguma coisa e o orgulho às vezes serve para isso.

Eu
falei com vários dos seus funcionários antes... que eles começassem a me evitar, dar desculpas
para não me responder.
Teve
aquele cara de preto que eu perguntei se preto também ia pro céu, por ser
preto, entende? Será que havia alguma vantagem em pertencer a uma raça
torturada ao longo de tanto tempo, por tanta gente. Coisa que acontece com
santo, né não? Lutam contra o preconceito, sofrem por um monte de coisa e viram
santos. Sabe o que ele me disse?
— Mas eu sou uma pessoa boa e já sofri bastante
também. Sou santo?
Ele riu, disse que as coisas não eram assim tão
simples, que havia os escolhidos que acabavam sendo testados e santificados.
Isso me deixou triste. Mais uma vez eu me senti excluído.

Um
outro me disse que era uma questão de fé. Que era preciso acreditar. E eu nem
acreditei no que ele dizia. Não podia, entende? Como eu vou acreditar em alguma
coisa que não me disseram? Não me mostraram de alguma forma. E quem acabou acreditando em outra coisa
porque foi ensinado a acreditar nisso? Essa é a justiça? Se é justo seguir o
que se acredita, até quem não acredita em alguma coisa porque não teve oportunidade
de aprender deveria ter espaço: Aquele que acredita em não acreditar no que não
sabe.
Me
falaram que o principal era saber amar incondicionalmente; amar o desconhecido,
o estranho. Mas amor não aproxima? Não faz a gente tentar entender o que ainda
não sabe? Como eu posso amar alguém que
nunca vi; que nem sei que existe, em algum lugar, e que só conheço por um
número estatístico? Não era uma boa
resposta. Talvez não fosse uma boa pergunta.
Agradar a alguém que eu nunca vi, que nem sei do que gosta, que é tão
genérico nos desejos e tão específico nas escolhas, e eu nem sei se realmente
está gostando do que estou fazendo.

Se
eu não souber que pequei ou não me lembrar de que pequei? Se eu não souber que
era pecado quando cometi , será que conta? Me conta? Eu não sei, é sério.
Nunca
soube se havia realmente alguma coisa depois, e a lei que eu seguia, da
sobrevivência, não fui eu quem criei. Alias, me falaram que se eu não desejasse
sobreviver era um pecado também. Um beco sem saída, não acha?
Eu
tentei fazer o certo, mas isso era tão diferente para cada um dos seus
representantes . Contraditório. Acho que
os seus escolhidos precisam de mais orientação para poder orientar. Não é uma
critica, é uma constatação. Me falaram que era meu amigo, que gostava de mim. Amigos
ajudam uns aos outros. Estou tentando ajudar, só não sei como...
Nem
o cara lá na porta soube. Eu perguntei, tudo isso, de novo. Não tive escolha.
Animais podem entrar? Eles não tem escolha, não sabem acreditar. São inocentes que matam inocentes na lei da sobrevivência que não escolheram seguir, mas que, como eu, não podiam recusar.
Animais podem entrar? Eles não tem escolha, não sabem acreditar. São inocentes que matam inocentes na lei da sobrevivência que não escolheram seguir, mas que, como eu, não podiam recusar.
Foi
isso que eu fiz... o cara lá da porta...
Ele me deixou entrar, só por um pouquinho, pra
poder vir aqui perguntar aquilo que ele não sabia responder. Eu não queria
deixar mais alguém duvidando... mas se eu não pergunto, não dá pra entender, não
é mesmo?
Então... Senhor, pode me responder?
sábado, 19 de novembro de 2011
Em Nós - Danny Marks
Ontem quando não havia amanhã
no tempo que em “hoje” escorria
sombras insones de dias,
não, não era eu quem dormia.
Depois, com sua ajuda,
andando claudicante
fui avançando, sempre adiante.
Mundo, mundo, vasto mundo
Que nome tenho?
E agora? José?
Manoel? Lino, talvez?
Não importa mais quem sou
Todos em um, sonho
Um em todos, exemplo
Mundo sem fim
No fim, motivo de tudo
Por fim, juntos, nos justificamos
No instante de nós
Ler...
sexta-feira, 18 de novembro de 2011
META ONDE III - Desperdício - Claude Ustt
-Tô te achando quieto, qual o problema?
-Nada não, só cansaço. Ando
sonhando com a aposentadoria.
-Você nem é tão velho cara.Talvez seja
bom procurar um médico.
-Tá falando igual a Zulmira: que ando parado demais, sem disposição, que
preciso de ajuda médica pra ver se tá
faltando alguma vitamina....
-Ela tá certa, tem um montão de
remédio novo pra ajudar a gente.
-Mas eu num to doente. É cansaço dessa vida de trabalho. Sustentar
quatro filhas não tem sido fácil. Ainda bem que as mais velhas já se formaram e
começam a ajudar nas despesas.
-Então é hora de aproveitar a vida meu amigo. Hoje em dia tem remédio
pra tudo, até o azulzinho milagroso pra reforçar o desempenho.
-Que isso home, eu lá preciso de reforço? Com oito anos de casado já
tinha as quatro menina.Só parou porque a Zuzu feiz a operação,cada idéia meu,
vê se me respeita!!!!
............
Em frente a tv aperta o botão do controle
aleatoriamente.Nada o agrada, detesta ficar sozinho,mas a mulher resolveu fazer
o tal curso de computação.Quase se arrepende de ter cedido tempos atrás.
Começou com o artesanato, depois a pintura em tela, culinária, corte e costura
e agora computação.
O pior é que não pode reclamar, ela dá conta.O que não
entende é de onde vem essa energia toda.Cuida da casa, das meninas, não há
sequer uma camisa sem
botão.Parece que o tempo passa diferente pra ela, continua encontrando prazer
em tudo o que é novo. Talvez de fato precise procurar um médico.
-Oi Zé, a aula terminou mais cedo, você já jantou? Deixei sua comida no
micro ondas.
-Comi pouco, tá tão quente que ando ruim de apetite.
-Então vou fazer um lanche pra nós. Porque não abre aquele vinho, hoje é
sexta feira, amanhã a gente dorme até
mais tarde.
-Até que é uma boa idéia.
Agilmente ela
prepara uns petiscos. Arruma a mesa e avisa que vai tomar um banho rápido.
Volta com uma camisola transparente, passa por ele deixando um rastro de perfume que parece ele não conhece.
-As meninas vão
dormir na casa da tua irmã, pra ajudar nos preparativos do aniversário da
Cristina.
-Olhe seu vinho Zuzu. Bom esse patê, comprou na padaria?

-Gostava Zuzu, gostava de desenho no papel, com régua, compasso, lápis
de ponta fina. Não tenho mais idade pra ficar colocando coisa nova na cachola.
A natureza tem seu tempo:a gente nasce, cresce, vive e morre.
-Em qual fase a gente tá na sua opinião, e em qual pedaço da vida
se aprende?
-Aprendê é pra criança, adolescente, jovem. Eu pelo menos to no final da tempo de viver. É
hora de descansar, aproveitar o sofá e tá muito bom.
-Mas você não acha que enquanto se aprende, a vida fica melhor e mais
longa?
-Num vô faze porcaria de curso nenhum.O que eu sei num foi suficiente
pra cuidar da família? Num dei conta?
-Calma Zé,não precisa ficar nervoso, foi só uma idéia boba que passou
pela minha cabeça.
-Boba mesmo, quer mais vinho?
-Quero mais um pouquinho.
..............
-Bom dia Zé,e aí,melhorou da canseira depois do fim de semana?
-Já falei que cansaço num é
doença. É coisa natural da vida. To bem e agradeço.
-Pelo rudeza da resposta melhorou coisa nenhuma, mas isso não é da minha
conta. Olha as peça que pediu pra revisão.
...............
Em frente a bancada se apressa em ajeitar os óculos,
fingindo uma observação minuciosa.
Quer mesmo é se enfiar no trabalho. Não falar com
ninguém.
Em casa Zulmira
cantarola baixinho enquanto rega vasinhos de flor. Finaliza as tarefas
de casa, para dedicar-se aos exercícios no computador da filha mais velha. Está
feliz, há muito não se sentia renovada
por energias que não define de onde vêem. Quem sabe pelo fato do marido, sempre alheio a sua presença, tê-la surpreendido com uma noite de amor como há muito não
acontecia. Sorrindo com malícia, pensa
que talvez seja interessante providenciar
outra garrafa de vinho para a próxima sexta feira.
No trabalho Ze não consegue se concentrar, mergulhado num mar de dúvidas e inseguranças.
Não esquece a noite de sexta feira.Só
pode ter sido efeito do vinho, ou alguma coisa que Zulmira anda aprendendo no
curso de computação. Talvez conversas picantes com as amigas. Como ela pode
estar tendo esse desempenho na cama
nessa altura da vida?

Não parecia sua
Zuzu calma e tranqüila, com
gemidos discretos, cheios de pudor. Era
uma fêmea faminta, ardente, ativa,
tomando as rédeas do jogo, que ele sabe,deveriam estar sempre em seu
poder.
Agora sente-se
numa encruzilhada: toma o tal azulzinho do qual o amigo falou,
desrespeitando o ciclo natural da vida, ou daqui pra frente, evita qualquer
intimidade maior com a mulher?
Destinos - Lariel Frota
Do livro O AMAFLOR
O amaflor continuou amando
Sem nada esperar da flor.
O futuro travestido em nuvens,
Entrega reais retiscências:
Vidas....desejos...possibilidades.
Anjos lindos, demonios enganadores
Disfarçando mentiras
Com dúbias verdades.
Um trem azul passa carregando
Pessoas,animais,frutos, semente.
Adiante um cão feio, sujo,sarnento,
Que ninguém enxergava, finalmente
Com asas de luz, parte pro firmamento!!!
terça-feira, 8 de novembro de 2011
Posso Ajudar? - Danny Marks
— Como?
— Você. Deve ter algum problema, não? Todos tem
problemas hoje em dia. As coisas andam difíceis por ai. Assaltos, violência,
essas coisas todas que se vêem na televisão.
— Não, tudo bem. Não preciso de ajuda.
— O que foi? Não acha que sou capaz de ajudar?
— Não, quero dizer, acho que é sim, mas...
— Então me conte qual o problema que ajudo.
— Mas, não tenho nenhum problema e...
—Entendi! Então se acha melhor que qualquer
pessoa. Se julga imbatível, não é? Pois fique sabendo que isso é uma mentira.
— Não disse isso. Só não quero a sua
ajuda, oras.
— Ah, então se julga melhor do que eu. Pensa que
pode ir resolvendo os seus problemas e que não tenho nada a ver com isso.
Típico isso, essa sociedade que vivemos está cada vez mais egocêntrica,
egoísta, desvinculada. Não se valorizam mais os valores sociais, a ajuda mútua.
— Creio que não está entendendo...

— Entenda... E U N Ã O T E N H O N E N H U M P R O
B L E M A. Não quero sua ajuda e de nenhuma
pessoa porque não estou com nenhum problema, certo?
— Negação. É sempre assim. Quando alguém se
preocupa em estender a mão é recebido desta forma. Imagine, na sociedade que
vivemos não ter problemas? Ora, não me
faça rir. Como alguém pode pensar assim hoje em dia? ISSO já é um problema.
— Na verdade tenho um problema, agora que percebo.
— Não disse? Tinha certeza que estava
escondendo algo importante. O que é?
— Tem uma pessoa chata, irritante mesmo, que está
me assediando em pleno horário em que poderia estar descansando a cabeça e está
me criando um problemão. POR QUE NÃO CAI
FORA!
— Então é assim. Vai se aliar a essa violência que
está destruindo o mundo, negando a melhor oportunidade que já teve em...
— SOCORRO!!!
— Por que está gritando? Já estou aqui para
ajudar.
— ESSE é o problema que não tinha há alguns
minutos. Sai da minha frente, sai daqui. FORA!!!
— Agora está entrando em contato com a sua raiva,
percebe? Essa é a origem dos problemas da humanidade, a raiva incontida que
agride justamente as pessoas que poderiam ajudar a...
— Dá licença, vou embora, não dá mais.
— Ei!!! Volte aqui, agora que já sei qual o seu
problema posso tentar ajudar.... Ei... Droga. Mais uma vez não consigo
ajudar alguém. Essas pessoas não entendem que precisamos nos mobilizar para
fazer o mundo melhor, temos que nos comunicar melhor, ser mais prestativos e...
—Como?
— Estava falando sozinho. Percebi que está com um
problema . Estou aqui para ajudar.
— Não tenho nenhum problema. Eu ajudo as
pessoas com problemas.
— Sim, entendo. A negação é uma coisa muito comum
hoje em dia, sabe? As pessoas acham que não tem nenhum problema, mas quando param
para pensar percebem que...
Assinar:
Postagens (Atom)