Me
corrijam os historiadores ou os psicólogos se estiver errado, mas o Machismo
nasceu quando Freud declarou implicitamente nos seus textos que havia uma psicologia
Feminina. Antes disso considerava-se apenas uma forma psicológica, a masculina
e suas variantes.
Freud
foi além, declarou que havia duas variantes do psiquismo que se complementavam
e formavam os alicerces da personalidade humana, o Feminino e o Masculino. Foi
uma verdadeira revolução, questionando valores arraigados, enraizados,
defendidos com unhas, dentes e armas há séculos. Então, havia uma parcela do Feminino
na personalidade do homem, bem como uma parcela do Masculino na mulher?
Muitos
dos conceitos apresentados por Freud foram questionados, uma boa parte serviu
de base para estudos posteriores e tornaram possível a evolução do conhecimento
da psicologia, que nos tempos atuais alcança as mais diversas formas e se
insinua na cultura popular.
Feministas
e especialistas podem gritar que estou errado. Que o Feminismo nasceu muito
antes de Freud, mais especificamente na Revolução Francesa (1789) e que teve
seu primeiro lance histórico com a célebre declaração de Olímpia de Gouges que
proclamou que a mulher possuía direitos naturais idênticos aos dos homens e que
por essa razão tinha direito de participar da formulação das leis e da política
em geral; isso nos idos de 1791.
Ok,
não vou questionar isso, aliás, concordo plenamente com Olímpia, mas revejam o
início do texto. Declarei que, na minha visão pessoal, o Machismo nasceu com
Freud ao declarar que, sim, a mulher tinha uma psicologia diferente e que havia
um conceito chamado Feminino presente na personalidade de homens e mulheres.
Note que isso remete diretamente ao que Olímpia declarava: “direitos naturais
idênticos” (não iguais, diga-se de passagem).
Mas o
que vem a ser o Feminino afinal? Em termos gerais representa a característica de
sociabilidade, de cuidar do outro mesmo em detrimento próprio, de sensibilidade
e empatia com o sofrimento alheio, de suavidade apaziguadora, de acolhimento,
de juntar, de encontrar a beleza na delicadeza, a busca da permanência, entre
outras coisas sempre creditadas especificamente à mulher.
Pela mesma
linha de raciocínio o Masculino é o protetor contra a adversidade, a força
motriz que modifica e transforma, o provedor dos recursos, o conquistador de
novos espaços, a força da sobrevivência que move a espécie em detrimento do
indivíduo, a energia implacável que nos faz avançar sempre em busca de algo
melhor e maior, a liderança; características normalmente creditadas
ao homem.
Freud
de certa forma disse que ambos os conceitos estão em maior ou menor grau em
todas as pessoas. Portanto mulheres poderiam ser líderes e guerreiras e homens
poderiam ser sensíveis, cuidadores e apreciadores da delicadeza apaziguadora. A
personalidade se formaria a partir desses pilares sendo influenciada mais para
um lado ou para outro, e assim estaria explicada a existência tanto do Poeta quanto
da Desbravadora, por exemplo.
Mas
isso é, obviamente em formas gerais, a formação de uma personalidade saudável,
e sabemos que a regra geral é outra, somos todos em maior ou menor grau,
insanos. E é nessa insanidade que nascem as variantes destrutivas do Masculino
e do Feminino: o Machismo e o Feminismo.
Jung,
outro pesquisador do psiquismo humano, contemporâneo e amigo pessoal de Freud,
falava sobre uma característica estranha da personalidade, a Sombra. Esta seria
uma variante negativa de tudo o que nossa mente poderia produzir de bom, um
contraponto que gerava equilíbrio, mas que poderia se tornar forte e destruir
completamente a psique.
Esse é
um ponto interessante, consideremos que equilíbrio não significa estagnação,
ainda mais em sistemas dinâmicos como a mente humana, que estão sempre se
transformando. Então o equilíbrio ocorre em uma faixa estreita, dinâmica, em
que hora tendemos para um lado, hora para outro. Ser “equilibrado” é, em última
análise (sem trocadilhos), permanecer nessa faixa estreita entre a parte boa do
nosso psiquismo e sua necessária sombra que nos questiona e nos puxa para o
lado oposto e precisa ser constantemente reabsorvida e incorporada no chamado
crescimento.
E
quando isso não ocorre? Aí tendemos ao radicalismo, caímos com maior força e
velocidade no “lado negro da força”, para usar um termo atual bem difundido e
não tão bem compreendido. Passamos a usar a energia que nos move de forma totalmente
tendenciosa e negativa.
Se
nossa personalidade se apoia mais na influência do Feminino, tendemos a ser
passivos demais, depressivos, estagnados, derrotistas, manipuláveis,
autodestrutivos. Se nossa personalidade se apoia mais na influência do
Masculino, tendemos a ser agressivos demais, manipuladores, paranoicos,
destrutivos, intolerantes.
Mas
como isso ocorre afinal? Difícil dizer, existem vários fatores que podem,
durante a evolução da personalidade, influenciar negativamente esse processo
impedindo um crescimento saudável. E é nesse ponto que baseio o meu argumento
apresentado pelo título.
A
sociedade como um organismo complexo também possui um “psiquismo”, se podemos
chamar assim, e se alimenta das mesmas bases que formam a personalidade
individual, com a diferença de que é um compósito gerado a partir dessas
personalidades individuais e suas formas de atuação.
Os
especialistas devem ficar furiosos com as minhas colocações mais simples sobre
temas tão complexos que apresentei até aqui, mas o meu campo de estudo é a
literatura e, portanto, me permito uma licença poética nesse sentido ao
apresenta-los como um convite a uma reflexão e aprofundamento quando houver
interesse particular. Por isso que me permiti usar os termos “revolução” e “evolução”
em relação ao “Machismo”.
A
revolução, ao meu ver, está na forma como a sociedade está se comportando,
questionando avanços humanísticos arduamente conquistados, radicalizando tanto
na forma intelectual quanto na intervenção concreta. Nunca tivemos tanta
violência tanto nas palavras quanto nas formas de agir. E não estou falando só
de governos, estou falando das pessoas em geral.
Revolução
negativa, neste caso, onde tenta se impor a força conceitos separatistas. O
retrocesso a tempos e argumentos ultrapassados em que havia a lógica do
dominador sobre o dominado, a exclusão, o poder conquistador da força sobre o
conquistado que se torna servil e resignado.
Evolução
porque o dinamismo mental cresce, ainda que seja na sua forma mais deformada e
autodestrutiva. A evolução de uma doença leva necessariamente a morte. Evoluir
também tem seu lado negativo, a sua sombra.
O
Feminismo poderia nos salvar? Creio que não, infelizmente. Até porque de certa
forma, difusa, ele é apenas uma variante feminina do Machismo. Muda o sexo, mas
não a sua forma destrutiva do Masculino negativo, até porque é no Masculino que
está a força para a mudança, ainda que seja para pior.
Feministas
devem reclamar deste último parágrafo, mas deixem-me esclarecer. O Feminismo se
perdeu nos primórdios ao assumir formas masculinas de agir, deixou de ser
Feminino, deixou de ter uma resistência pacífica e apaziguadora, uma
transformação pela razão, pela lógica, pela flexibilidade, pela não-agressão. Ao
meu ver o maior representante do Feminismo primordial verdadeiramente falando
foi um homem, Gandhi. Vejam a diferença e reflitam.
Um
mundo Machista é polarizado, reduzido a dois extremos conflituosos, excludente,
doente. E a ele se alia a sua versão de gênero, o Feminismo que também caminha
a passos largos para se tornar tão radical e doente quanto.
Precisamos
urgentemente curar esse mundo que não superou o seu édipo, que ainda divide
entre “nós” ou “eles”, que renega a multiplicidade dos gêneros e reduz ao
extremo da dureza implacável os conceitos que nos permitiram crescer como
humanidade.
Me
corrijam os especialistas, mas a minha interpretação é de que o Machismo (e
o Feminismo) da atualidade, nada mais é do que a incapacidade da nossa
sociedade de superar o seu édipo e crescer para sua forma mais saudável que
incorpora o Masculino e o Feminino como forças complementares e necessárias da
nossa evolução como indivíduos e como entidade coletiva.
Diante
de tantas neuroses e histerias que vemos diariamente em todos os lugares só
posso finalizar de uma forma este texto.
Que
FREUD nos ajude!
Nenhum comentário:
Postar um comentário