sexta-feira, 2 de julho de 2010

Homem Só - Danny Marks


Não é fácil ser um homem só.
Foi uma decisão tomada aos poucos, ao longo dos fatos que ocorreram. Quem nasce em uma família grande tem essa necessidade de espaço, mas também está acostumado a dividir as coisas com mais facilidade.
Então, sempre pensei que quando morasse sozinho seria uma festa atrás da outra.
Comprei meu apartamento e começaram os problemas. Droga, ninguém fala pra gente que o sonho tem ares de pesadelo quando se torna realidade. Nem reclamei de ter que fazer comida, tem essas coisas prontas que se compra, descongela e come ou então a opção de ir a um restaurante.
Quando enjoei de comer sempre a mesma comida, até tinha formas e nomes diferentes mas o gosto era o mesmo, e a conta do restaurante no fim do mês ficou mais alta que a antena parabólica, achei melhor me matricular em um curso de culinária.
Nem vou falar do preconceito das mulheres em relação a um homem que está disposto a cozinhar a sua própria comida. Quatro mulheres, dois gays e eu. Isso não podia dar certo, mas achei que se era para ter uma boa comida valia a pena. E comecei pela professora, só para mostrar que não era gay.
As conversas mudaram, para pior. Para as mulheres passei a ser o crápula que estava se aproveitando da minha vantagem de ser homem para conseguir receitas exclusivas; já os gays ficavam tentando me passar receitas novas, o tempo inteiro, e não conseguia mais fazer nada direito, nem mesmo lavar a louça. Caí fora do curso, já havia aprendido o suficiente para não morrer de fome, ou seja, seguir fielmente uma receita e rezar muito para que nada desse errado.
Mas esse não foi o pior problema, depois de alguns meses você descobre que só passar uma vassoura na casa não resolve. Não sou de ficar fazendo faxina, nada contra quem faz, mas detesto isso, então o melhor era contratar uma faxineira que são pessoas que devem gostar de fazer o que os outros não gostam. Você paga caro para tirarem o lixo de sua casa, mas se livra do transtorno.
Estava feliz, até que um dia percebi que não era só a sujeira que sumia, as minhas cervejas também.
Não sou um cara mesquinho, mas beber em serviço é um problema. Parei de comprar cerveja. Como represália apareceram calcinhas no banheiro.
Sempre achei estranho uma mulher lavar a sua calcinha durante o banho, isso gera um consumo absurdo de tempo, energia e água, quando seria mais fácil lavar em um tanque ou em um balde, mas o pior é encontrar a dita cuja esquecida no registro do chuveiro.
Dei bronca na empregada, mas parece que há alguma coisa errada com as mulheres, não entendem o que a gente diz. Ela simplesmente passou a ir sem calcinha pro trabalho.
Até ai tudo bem, a gente finge que não vê, mas quando passou a fazer a limpeza pelada a coisa ficou absurda. Precisava fazer alguma coisa com urgência.
Ampliei o meu cardápio.
Foi quando um amigo me disse que isso era uma roubada, que havia perdido uma grana alta em um processo por assédio. Mas, eu que estava sendo assediado!
Não adiantava, para evitar problemas fiquei sem a comida e com a sujeira, pelo menos não haveria problemas maiores.
Foi o que pensei.
Outro dia recebi um convite para ir em uma festa só para homens. Era o que esperava, já imaginava as mulheres seminuas, cerveja a vontade... todos os detalhes.
Quando cheguei na festa só tinha homens mesmo, uns maiores que os outros. Tanto em altura quanto em circunferência. Nunca vi tamanha concentração de músculos, gordura abdominal e pelos, por metro quadrado.
Era uma casa de horrores.
Mas, já que estava por ali, melhor não fazer desfeita. Se é para ficar trocando uma ideia e bebendo, falando sobre mulher e futebol, qual o problema? Pelo menos a gente se distrai.
Mas a coisa foi ficando feia.
Principalmente depois que abriram algumas garrafas de Whisky.
Uns caras começaram a tirar a roupa  e a dançar pelados, de brincadeira eu acho, depois alguns começaram a se pegar nos cantos. Um deles tentou me pegar pelo braço e me dar um beijo.
Ganhou dois beiços inchados. Outros três me seguraram e arrancaram a minha roupa, destruindo minha melhor camisa. A essa altura já estava era preocupado com o que mais iriam rasgar, então descobri que a adrenalina é realmente fabulosa quando se está em situações de risco.
Dei tanta pernada e soco que faria inveja ao deus Shiva ou o raio de deus Hindu com mil braços. Saí correndo, pelado mesmo, até encontrar uma viatura da polícia.
Acabei preso por atentado violento ao pudor.
Não adiantou tentar explicar que na verdade estava tentando proteger o meu pudor entre outras coisas.
Felizmente uma advogada de porta de cadeia se interessou pelo meu...caso. Acabei sendo libertado e inocentado no ato de legítima defesa da honra masculina, não conseguiram prender ninguém da festinha, nem recuperar meus documentos ou dinheiro.
A advogada me levou para a cama, digo casa, e pediu que assinasse alguns papeis para que pudesse resolver a minha situação. Dias depois recebi os documentos, junto com uma intimação para desocupar o imóvel em que morava.
A advogada havia me dado um golpe e estava limpando minha casa de um jeito que nem a faxineira conseguiria.
Arrumei outro advogado, desta vez um homem para garantir, e entrei na justiça, mas essas coisas levam tempo para serem resolvidas, então fui morar em um barraco emprestado por um conhecido.
A desgraçada foi me visitar no meio da favela, com o meu carro e, só para tirar uma onda, me devolveu o telefone. Com um riso safado disse que eu poderia ficar com o celu lá, sério, ela disse isso mesmo.
Essa é a selva de pedra, uns comendo outros e pelo jeito eu estava no subsolo da cadeia alimentar.
Pouco depois que ela saiu recebi uma ligação a cobrar, o que poderia ser pior? Atendi.
“É o siguinte, istamo cum a dona aqui, se quizé vê ela de vorta vai tê que pagá uma grana. Si ligá pra puliça vai recebê ela em pedacinho pelo curreio, tá ligado?”
Só então acreditei que Deus existe, e com toda fé do meu coração renovado falei pro malandro.
“Escuta aqui, ô palhaço! Sabe com quem qui tu tá falano? O que tu fizé cum ela vou e faço em dobro cuntigo. E qué sabê mais, to ligano agora prus Omi pra í ti busca, ô pilantra! Tú é machu? Quano os cara ti pegá vai te arregaçá todinho, mané otário, tá ligado?”.
Desliguei, joguei o celular no primeiro canal que encontrei, peguei minhas coisas e fui curtir a vida.
Meu advogado conseguiu reaver meus bens, ficou com trinta por cento para ele, mas pra quem já tinha tudo por perdido até que fiquei no lucro.
Pelo que me informaram a advogada não fora a nenhuma audiência, a policia foi procurar por ela e descobriram um monte de vitimas dos golpes, isso facilitou reaver os meus bens, e me colocou na mira da justiça.
Mas a justiça foi Divina, encontraram ela mancomunada com um grupo de traficantes.
Agora ando só. Faço a minha comida, limpo a minha casa, não tenho amigos, não tenho mulher, e principalmente não tenho advogado.
O problema é quando bate aquela vontade, de fazer aquela coisa que precisa de outra pessoa, sabe?
É um saco jogar videogame sozinho, mas assim é a vida.
O jeito é ser feliz.

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